A internet mudou a forma como as pessoas discutem. Verifique qualquer sistema de comentários, fóruns ou quadros de mensagens e vai descobrir pessoas debatendo por que seus produtos escolhidos são melhores do que os do outro cara.
Mac versus PC, PS3 versus Xbox 360, iPhone versus Android – e por aí vai.
Normalmente, esses argumentos acontecem entre homens, porque os homens vão defender seu ego não importa quão ridículo é o insulto. São geralmente sobre coisas geeks que custam muito dinheiro, porque essas batalhas acontecem na internet, onde pessoas com conhecimentos técnicos polemizam e quanto mais caro o produto, maior a lealdade.
No mundo das seções de comentários online, fãs raivosos geralmente são chamados de fanboys. É uma gíria da internet para fãs obsessivos. O termo se originou em uma convenção de quadrinhos, em 1973, como o título de uma revista sobre os quadrinhos da Marvel feita por fãs, mas, nos últimos anos, sofreu uma mutação e passou a ser usada como um insulto leve que pode ser aplicado a qualquer um que passa a contar aos outros sobre seu amor por… coisas. Quando alguém escreve uma dúzia de parágrafos online defendendo suas
preferências ou atacando um competidor, ele é rapidamente marcado como fanboy. Isso não é algo novo, é só um componente da criação de marcas, que é algo que os marqueteiros e publicitários conhecem desde que a Aveia Quaker criou um logo amigável para colocar nos seus saquinhos.
Nunca houve, claro, nenhuma amigável família Quaker fazendo a aveia em 1877. A empresa queria que as pessoas associassem a confiabilidade e a honestidade dos Quaker com seu produto. E funcionou.
Essa foi uma das primeiras tentativas de se criar lealdade de marca – aquela nebulosa conexão emocional que as pessoas têm com certas empresas, o que as transforma em defensoras e advogadas de corporações que não dão a mínima para elas.
Em experiências da Universidade Baylor, onde as pessoas recebiam Coca-Cola e Pepsi em copos sem marcação e depois passavam por uma tomografia, o aparelho mostrava claramente que um certo número delas preferia a Pepsi enquanto a experimentava. Quando foi dito a essas pessoas que estavam bebendo Pepsi, uma fração delas, de pessoas que tinham gostado de Coca por toda vida, fez algo inesperado. A tomografia mostrou seus cérebros embaralhando os sinais de prazer, amortecendo-os. Depois, essas pessoas contaram aos pesquisadores que tinham preferido a Coca nos testes de sabor.
Eles mentiram, mas em sua experiência subjetiva da situação, não tinham mentido. Realmente sentiram que preferiam a Coca no final, e alteraram suas memórias para combiná las com suas emoções. Eles tinham sido dominados pela marca em algum momento no passado e eram leais à Coca-Cola. Mesmo que gostassem realmente da Pepsi, enormes construções mentais os prevenia de admiti-lo, ainda que para si mesmos.
Acrescente esse tipo de lealdade a algo caro, ou um hobby que exija um grande investimento de tempo e dinheiro, e você terá um fanboy. Fanboys defendem suas preferências e ridicularizam os competidores, ignorando fatos se eles contradizem sua conexão emocional.
Então, o que cria essa conexão emocional com as coisas e as empresas que fazem essas coisas?
A escolha.
Pessoas que não têm escolha a não ser comprar certos produtos, como papel higiênico e gasolina, são chamadas de “reféns” pelos marqueteiros e pelas agências de propaganda. Como não podem escolher ter ou não ter um produto, é menos provável que se importem se uma versão de papel higiênico é melhor do que a outra, ou se um posto de gasolina é da Shell ou da Chevron.
Por outro lado, se o produto é desnecessário, como um iPad, há uma grande chance de que o cliente se torne um fanboy porque ele teve de escolher gastar muito dinheiro nele. É o escolher uma coisa sobre a outra que leva a narrativas sobre por que você fez determinada coisa, algo que normalmente está conectado à sua autoimagem.
A gestão de marcas é construída sobre essa concepção ao dar a opção de criar a pessoa que você pensa que é através da escolha de se alinhar com a mística de certos produtos.
As propagandas da Apple, por exemplo, não mencionam como seus computadores são bons. Em vez disso, elas dão exemplos do tipo de pessoas que compram seus computadores. A ideia é encorajá-lo a dizer: “Sim, não sou um nerd conservador. Tenho gosto e talento, até estudei um pouco de arte na faculdade”.
Os computadores da Apple são melhores do que os computadores da Microsoft? Um é melhor do que o outro quando olhados empiricamente, baseado em dados e análises, testes e comparações objetivas? Não importa, porque essas considerações acontecem depois que uma pessoa começou a se ver como o tipo de pessoa que possui um. Se você se vê como o tipo de pessoa que possui computadores Apple e que dirige carros híbridos, ou que fuma Camels, você foi etiquetado. E depois que uma pessoa é etiquetada, ela vai defender a marca encontrando falhas na alternativa e apontando os benefícios da sua.
Há uma série de tendências cognitivas que convergem para criar esse comportamento.
Esse efeito de atribuição aparece quando você sente que as coisas que possui são superiores às coisas que não possui.
Psicólogos demonstram isso ao perguntar a um grupo de pessoas quanto acham que vale uma garrafa de água. O grupo vai concordar com um preço ao redor de $5, e aí alguém no grupo recebe uma garrafa de graça.
Depois de uma hora, eles perguntam à pessoa por quanto ela estaria disposta a vender a garrafa de volta para os pesquisadores. Eles normalmente pedem mais dinheiro, como $8. A posse acrescenta valor emocional às coisas, mesmo que essas coisas sejam gratuitas.
Outro viés é o da falácia dos custos irrecuperáveis. Isso acontece quando você gasta dinheiro em algo que não quer ter ou não quer fazer, mas não consegue evitar. Por exemplo, você pode pagar muito por alguma comida pronta, que é uma porcaria, mas você a come mesmo assim, ou continua assistindo a um filme mesmo depois de perceber que é horrível.
O custo irrecuperável também pode pegá-lo de surpresa. Talvez você seja o assinante de algum serviço por muito tempo e percebe que é muito caro, mas não termina sua assinatura por causa de todo o dinheiro que investiu no serviço até agora. A Blockbuster é melhor do que a Netflix ou TiVo é melhor do que um DVR genérico? Se você gastou muito dinheiro em assinaturas, pode não estar disposto a trocar de serviço por pensar que investiu na marca.
Essas tendências alimentam o maior dos comportamentos que são responsáveis por gestão de marcas, fanboys e discussões de internet sobre por que a coisa que você possui é melhor do que a coisa que o outro cara possui – viés do suporte de escolhas.
Funciona assim: você tem várias opções de, digamos, televisões. Antes de fazer uma escolha, você tende a comparar e contrastar todas as diferentes qualidades de todas as televisões no mercado. Qual é melhor, Samsung ou Sony, plasma ou LCD, 1080p ou 1080i – ugh, há tantas variáveis! Você, por fim, escolhe uma opção e depois de fazer a sua decisão olha para trás e racionaliza as suas ações acreditando que a sua televisão era a melhor de todas as televisões que poderia ter escolhido.
No varejo, esse é um fenômeno bem entendido, e para evitar o remorso do comprador, tentam não oprimi-lo com muitas escolhas. Estudos mostram que se você tem somente algumas opções no ponto da compra, provavelmente terá menos inquietações sobre sua decisão mais tarde.
É puramente emocional o momento de escolha. As pessoas com danos cerebrais em seus centros emocionais, que se tornaram uma espécie de Spock de pura lógica, acham impossível decidir as coisas mais simples como qual marca de cereal comprar. Eles ficam paralisados no corredor, contemplando todos os elementos de sua potencial decisão – as calorias, os formatos, o peso líquido – tudo. Eles não conseguem escolher porque não possuem conexão emocional com nada.
Para combater a dissonância pós-decisional – a sensação de que se comprometeu com uma opção quando a outra opção poderia ter sido melhor –, você se esforça em se sentir justificado quanto ao que selecionou para diminuir a ansiedade criada ao se questionar.
Tudo isso forma um grupo gigantesco de associações neurológicas, emoções, detalhes de autoimagem e tendências em torno das coisas que possui.
Então, da próxima vez que estiver pronto para repetir cem razões pelas quais seu celular, TV ou carro é melhor do que o de outra pessoa, hesite. Porque você não está tentando mudar a mente da outra pessoa – está tentando apoiar a sua.