Dois Minutos de Leitura

Aqui estamos, de novo:
Povo Brasileiro

Onde está o ‘’povo brasileiro’’, aquele falado e cantado como gentil e amigo?

Já me disseram que ‘’não devemos debandar, ir embora daqui’’, mas ficar e tentar mudas as coisas...

Os ‘’nossos’’ jovens só se preocupam em usar roupas de etiqueta, automóvel último modelo e fazer baderna nos fins de semana.

Sei que muitos estudam, saem da faculdade com uma profissão. Mas não são todos apenas profissionais. Cultura geral, zero! Perderam a sensibilidade, a gentileza.

Esses fazem parte das classes média e alta. E os pobres, os que vivem em favelas, nem a religião segura mais, a fome é maior que a crença em Deus.

No Japão milenar, o cidadão desonesto era penalizado. Muitas vezes, envergonhado, ele praticavava o Hara-Kiri (suícidio), e os seus descendentes eram amaldiçoados até a 5° geração.

Parece-me que até lá no Japão, as coisas também mudaram.

E, aqui no Brasil, por que será que tanta gente humilde foi amaldiçoada com a falta de casas, escolas e empregos bem remunerados?

Será que lá em Brasília, os políticos pensam que tudo está bem, porque pra eles está tudo bem?

WASSERMAN, Margarita. Crônicas de Curitiba. Curitiba: Juruá, 1998. p. 20.
Ex-Membro do Centro Paranaense de Cultura.
 
Vai dar mais de dois minutos mas acho que vale a pena...

Mentiras, escândalos, velhice: a história por trás da renúncia de Bento XVI

Postado em 29 nov 2013 por: Diario do Centro do Mundo

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Publicado originalmente na BBC Brasil

Em fevereiro deste ano, o agora papa emérito Bento 16 chocou o mundo quando se tornou o primeiro pontífice a renunciar em quase 600 anos. Mas a atenção rapidamente se voltou para a sua sucessão, e a consequente eleição do argentino Francisco.

Em meio ao episódio dramático, uma pergunta nunca foi totalmente respondida – por que Bento 16 renunciou?

Em sua declaração oficial de renúncia, o papa Benedito creditou sua saída à fragilidade de sua idade avançada e às exigências físicas e mentais do cargo, mas sempre houve a suspeita de que algo não havia sido contado. A minha apuração confirmou isso.

Fui visitar o cardeal nigeriano Francis Arinze em seu apartamento, com vista para a Praça de São Pedro, no Vaticano. Arinze é uma das figuras mais importantes da Igreja Católica atualmente e conhece o Vaticano como ninguém. Ele foi, inclusive, ainda que por pouco tempo, considerado um provável sucessor do papa Bento 16. Além disso, Arinze era um dos poucos cardeais a quem o alemão contou pessoalmente a notícia de iria renunciar.

Levantei o assunto dos escândalos que precederam o anúncio bombástico do papa e, em particular, o vazamento dos documentos papais, conhecido como Vatileaks, pelo ex-mordomo de Bento 16, Paolo Gabriele. Isso poderia ter contribuído para a renúncia do então pontífice? A resposta de Arinze foi inesperada.

“É legítimo especular e dizer “talvez”, porque alguns de seus documentos foram furtados secretamente. Claro que poderia ser uma das razões (para a renúncia de Bento 16)”, afirmou Arinze.

“Talvez ele tenha ficado tão triste ao tomar conhecimento de que seu próprio mordomo, em quem tinha confiança, vazou tantas cartas que um jornalista poderia escrever um livro. Não esperava que ele estivesse contente com isso”.

No Vaticano, membros jovens e ambiciosos da Igreja são aconselhados a “ouvir muito, ver tudo e não dizer nada”. O fato de que uma figura tão importante dentro da Igreja não siga à risca tal cartilha é minimamente surpreendente.

Na essência, o papa Bento 16 era um acadêmico, um téologo e um intelectual. “Para ele, o inferno seria participar de uma semana de treinamento sobre como melhor gerir a Igreja”, ironiza uma fonte.

O azar do agora pontífice emérito foi ascender ao trono de Pedro em um momento em que havia um vácuo de poder, no qual um número considerável de integrantes de meio escalão da Cúria, a máquina administrativa da Igreja, se tornaram “pequenos Bórgia” (em alusão à família espanhola-italiana de mesmo nome que produziu três papas, lembrados por seu governo corrupto e ganância pelo poder).

Essa última declaração veio da figura mais importante da Igreja atualmente, o próprio papa Francisco, conhecido por não medir suas palavras. “A corte é a lepra do papado”, disse ele certa vez. O argentino descreveu a Cúria como narcisista e egoísta. Foi a mesma Cúria com a qual Joseph Ratzinger teve de lidar.

Intrigas e interesses

No período que antecedeu à morte do papa João Paulo 2º (1920-2005), o coração da Santa Sé foi dominado por intrigas e brigas internas. Essa foi a justificativa para o ex-mordomo do papa, Paolo Gabriele, tornar público documentos confidenciais.

Mas Gabriele afirmou que sua relação com o papa Bento 16 era como “a de um pai com um filho”. Sendo assim, por que ele agiu de forma a constranger o homem de quem era tão próximo?

“Ele disse que havia visto muitas coisas ruins acontecendo dentro do Vaticano. Em um dado momento, ele afirmou que havia chegado a seu limite”, disse a mim a advogada de Gabriele, Cristiana Arru, enquanto agarrava as contas de seu rosário, em sua segunda entrevista pública.

“E então ele buscou uma saída para tudo isso. Ele diz que viu mentiras sendo contadas. Meu cliente pensou que o papa não estava sendo informado sobre alguns assuntos importantes que estavam acontecendo.”

Gabriele foi considerado culpado de “furto qualificado” e passou três meses sob custódia antes de ser perdoado pelo Papa. Mas isso não foi o fim de tudo. O líder da Igreja convocou um inquérito sobre o caso.

Três cardeais foram incumbidos de produzir um relatório de 300 páginas, a ser mantido a sete chaves. Mas um importante jornal italiano informou que havia conseguido ter acesso a parte de seu conteúdo. O resultado? Vazamentos ainda mais embaraçosos, desta vez com rumores sobre a existência de uma rede de sacerdotes homossexuais que exercia “influência inadequada” dentro do Vaticano.

As dores de cabeça continuaram a incomodar o papa alemão. O estopim ocorreu com o episódio envolvendo o presépio anual montado na Praça de São Pedro durante o Natal.

Durante anos, acordos fechados no Vaticano foram superfaturados. Quando um delator tentou reformar o sistema, funcionários da corte papal conveceram o pontífice a “promovê-lo” a um cargo a 6,5 mil quilômetros de Roma.

Episódios semelhantes ocorreram no Banco do Vaticano, durante anos uma fonte de manchetes constrangedoras para a Igreja Católica. A instituição financeira havia sido criada para ajudar as ordens religiosas e as fundações em transferir dinheiro para partes distantes do mundo. Mas quando uma proporção considerável das transações é feita em dinheiro e está sendo enviada para regiões politicamente instáveis do planeta, não é preciso ser um gênio para prever que algo possa dar errado.

Parece que os funcionários do banco tomaram decisões importantes sem informar o Papa. Quando o conselho da instituição demitiu seu presidente reformador, Ettore Gotti Tedeschi (convenientemente no dia em que a notícia da prisão de Gabriele recebia toda a atenção da imprensa), o pontífice foi um dos últimos a saber do ocorrido. Posteriormente, disse, por meio do seu secretário, que ficou “muito surpreso”. Tedeschi era um membro da Opus Dei (organização católica dedicada à evangelização) e pensava que estava próximo do papa, mas, no final, isso não o protegeu.

Mudança

Será que tudo isso foi um fardo muito grande para um Bento 16 envelhecido?

A resposta talvez esteja nas palavras do porta-voz do Vaticano, o padre Federico Lombardi. Disse ele: “A Igreja precisava de alguém com mais energia física e espiritual que seria capaz de superar as adversidades e os desafios de governá-la neste mundo moderno em constante mudança”.

Na minha avaliação, a Igreja Católica tem agora uma grande oportunidade para seguir em frente e enfrentar os desafios do século 21. Muitas vezes vista como remota, sua liderança agora precisa debater questões polêmicas como a contracepção e casamento gay. A reforma chegou na esteira do escândalo. Isso é algo que não passou batido pelo cardeal Arinze.

“O que você tem de se lembrar”, diz ele , “é de que muitas vezes Deus escreve certo por linhas tortas.”

Fonte original: http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2013/11/131128_analise_por_que_bento_16_renunciou_lgb.shtml
 
Última edição:
Vai dar mais de dois minutos mas acho que vale a pena...
haha.

Tudo bem, o título "dois minutos" não é literal; sua origem está explicada no fim do primeiro post do tópico.

Uma crítica: o texto do "Diário do Centro do Mundo" poderia:

- informar um autor;

- ter alguns links pertinentes, em uma dúzia de partes (Ex.: "considerado um provável sucessor do papa Bento 16", "disse ele certa vez.", "um importante jornal italiano informou" [qual?] etc.)


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http://trasel.com.br/?p=615

Como checar fontes e identificar manipulações em redes sociais
Publicado em 22/11/2013 por Träsel


Recentemente, a disputa pelo destino de um casario na rua Luciana de Abreu, em Porto Alegre, encontrou um desfecho no compromisso da construtora Goldsztein — parte do grupo Cyrela — em demolir apenas três dos seis imóveis, restaurar estes três preservados e ainda realizar uma doação de R$ 2 milhões para a conclusão das obras na Casa do Menino Jesus de Praga. Uma legítima solução salomônica, que provavelmente agradará à maioria dos descontentes com mais um caso de estupro urbanístico em Porto Alegre. Legal, não?

A Goldsztein, todavia, parece não ter achado suficiente a mídia espontânea garantida pela preservação de metade das casas e doação de milhões a uma instituição de caridade. Para reforçar sua disposição em deixar de degradar a paisagem urbana de Porto Alegre, resolveram degradar a paisagem virtual usando perfis falsos no Twitter para espalhar a notícia do acordo com o Ministério Público.

O astroturfing é uma prática a ser combatida porque causa a degeneração da esfera pública eletrônica criada pelas redes de computadores. Sabe como você não pode mais assistir a um vídeo incrível sem suspeitar que se trata de um viral criado para divulgar alguma marca, ou como você não pode mais ver um blogueiro elogiando uma marca, produto ou serviço sem se perguntar se está diante de um post pago? Esse cinismo generalizado é um efeito do abuso da confiança do leitor por parte de empresas e pessoas sem o menor respeito pelo patrimônio comum que é a Internet.

Agências de publicidade e assessorias de imprensa que se dizem especialistas ou fanáticos pela cultura digital, mas se valem do astroturfing, não são uma coisa nem outra. Primeiro, porque essa estratégia, como qualquer mentira, tem pernas curtas. Segundo, porque ninguém que ame a Internet contribuiria voluntariamente para sua degradação através de manipulações baratas. Já bastam os spammers, phishers e outros vermes à solta na rede. Se você é um anunciante, fique longe desse tipo de agência ou profissional.

Trata-se, além disso, de uma estratégia preguiçosa. Toma atalhos perigosos para disseminar informação e coloca em risco a imagem do cliente — que certamente não pagou pouco pelo serviço. Por exemplo, se o responsável por esta ação houvesse se dado o trabalho de me conhecer apenas superficialmente, saberia que não é boa ideia tentar esse tipo de coisa por perto. De fato, uma das principais motivações para este artigo é, provavelmente, ter me ofendido por me julgarem um alvo adequado.

Todo mundo precisa comer e pagar a conta do bar, mas profissionais que coadunam com o astroturfing estão tornando o mercado de trabalho muito mais miserável para si e para todos os outros. São o equivalente de fura-greves. Ninguém está exigindo de você que cure o câncer, mas que pelo menos não ajude a disseminá-lo. A única exigência do cosmos é que tenhamos responsabilidade; não é muita coisa e quem não consegue nem isso deveria ser punido com a ignomínia.

Como forma de contribuir para o fim do astroturfing, sock-puppetry e outros flagelos, aí embaixo está um tutorial com dicas para identificar perfis falsos em redes sociais, seguidas pelos passo-a-passo de minha investigação a respeito dos perfis usados por alguma agência de publicidade por delegação da Goldsztein. Recomendo acionar o modo de tela cheia, para ver melhor as imagens, ou baixar os slides em seu computador.




A quem leu o texto e achou algo de interessante nele, aconselho ir à postagem original e aproveitar a apresentação presente no fim do post: http://trasel.com.br/?p=615


:yes:
 
haha.

Tudo bem, o título "dois minutos" não é literal; sua origem está explicada no fim do primeiro post do tópico.

Uma crítica: o texto do "Diário do Centro do Mundo" poderia:

- informar um autor;

- ter alguns links pertinentes, em uma dúzia de partes (Ex.: "considerado um provável sucessor do papa Bento 16", "disse ele certa vez.", "um importante jornal italiano informou" [qual?] etc.)

A postagem original é da BBC, vou incluir a fonte.
 
A postagem original é da BBC, vou incluir a fonte.
:yes:

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via a sensacional Pública:

OS BOIAS-FRIAS DO FUTEBOL
02.12.13 Por Ciro Barros e Giulia Afiune, com fotos de Renato Leite Ribeiro


A Pública visitou o universo dos pequenos times e dos jogadores profissionais desempregados e subempregados que o Bom Senso F.C denuncia. Abuso é pouco, constatou.


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Cachorrinhos brincam enquanto a bola rola em campo. O gramado estava muito ruim.


Terça-feira de manhã, céu nublado, aquele “chove-não-chove” no ar. A reportagem da Pública está em Mauá, município da Grande São Paulo, para acompanhar um jogo de futebol sem torcida, estrelado pelo Grêmio Esportivo Mauaense, da Segunda Divisão do Campeonato Paulista, abaixo da Série A3. Com o objetivo de montar uma equipe para o próximo campeonato do primeiro degrau do futebol profissional, os jogadores de Mauá enfrentam um time de jogadores ainda mais frágeis: o dos desempregados, reunidos em uma equipe montada pelo Sindicato de Atletas Profissionais do Estado de São Paulo (SAPESP) para que eles possam manter a forma enquanto não voltam a jogar profissionalmente.

Ali não há fotógrafos, jornalistas, símbolos das federações, placas de publicidade. Ninguém está nas arquibancadas para vibrar pelas jogadas no campo deteriorado, cheio de entulho. Dois cachorrinhos brincam no fundo do “campo” do Estádio Pedro Benedetti, municipal, que fica escondido atrás de um distrito da Polícia Militar.

Mas não falta emoção em um jogo em que cada um luta por um lugar ao sol, pela remota chance de realizar o sonho de se tornar, ou continuar a ser, um jogador profissional de futebol. A Pública acompanhou a partida, vencida por 3 a 2 pelo Mauaense, assistiu a ótimas jogadas e ao golaço de Jorge, o craque do time vencedor, do lugar do quarto árbitro – privilegiadíssima posição em um estádio “de verdade”- e, como faziam os jornalistas esportivos de outros tempos, desceu aos vestiários para entrevistar os jogadores.

Não estávamos ali para fazer uma crônica da partida, mas para saber como é a realidade dos jogadores da base da pirâmide do negócio futebol. Saber o que esperam aqueles que não ganham salários milionários, não saem em capas de revista, nem vendem milhões de camisas com seus nomes estampados, cuja existência era ignorada pela mídia até recentemente, quando o movimento Bom Senso F.C – formado por atletas da Série A e B do Campeonato Brasileiro – girou os holofotes dos bons gramados para iluminar a dura realidade do mercado de trabalho de futebol brasileiro em que campinhos como o de Mauá e o desemprego como os atletas da equipe da SAPESP são bem mais numerosos que as camisas do times de elite.

A maioria dos garotos que encontramos nos chuveiros têm por volta de 20, 21 anos, “velhos” para iniciar a carreira no futebol, e estão longe de obter um contrato para valer em um clube profissional. Mas não desistiram do sonho como diz o meia-atacante Eddy Rocha, um baiano de 21 anos, da equipe da SAPESP: “Me indicaram pro time do sindicato aí e eu tô aqui agora, mantendo a forma pra me empregar”, diz. Antes de chegar ali, o morador do bairro da Plataforma, na periferia de Salvador, chegou a passar pelas categorias de base pelos principais times baianos – o Vitória e o Bahia – mas não conseguiu a vaga como profissional. Foi para Pernambuco jogar no Ferroviário do Cabo, time da segunda divisão pernambucana, uma experiência que ilustra um pouco pelo que passam os aspirantes ao futebol profissional.

“A gente não tinha cozinheiro, tinha que ir um rapaz entregar marmita pra gente: feijoada, saladinha e um suco, isso quando vinha. A gente dormia num tatame. Fizeram o pedido por beliche e não veio enquanto eu tive ali. Todo mundo ganhava um salário mínimo, que chegou a atrasar uns três meses. Só consegui me manter com a ajuda de um amigo de infância, de Salvador”, relembra Eddy.

Enquanto penava no Recife, Eddy recebeu de um empresário para participar de testes de dois times da Série A2 paulista , o Audax e o Grêmio Osasco, que pretendiam disputar o sub-21. Pela idade era a última chance de Eddy jogar nesse campeonato e ele se despediu da mulher e do filho de um ano no Recife e veio a São Paulo sozinho para tentar a sorte. A história, porém, era “uma barca furada”, como diz. Quando chegou, o período de testes tinha se encerrado e Eddy ficou sem chance e passou aperto até ser acolhido por um amigo em São Paulo. Não voltou para o Recife porque acha que lá ainda vai ser mais difícil realizar seu sonho. E aceitou as desculpas do tal empresário, que ainda tenta convencê-lo a assinar um contrato com ele. “Ele disse agora que quer fazer um DVD meu pra mandar pra uns clubes, me dar uma ajuda de custo. Mas é coisa só de boca né, aí fica difícil”, diz, relutante. Se nada der certo, Eddy, que estudou até a oitava série, diz que vai virar professor de Educação Física.


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Na Segunda Divisão do Paulista, Mauaense jogou para ninguém: média de 96 torcedores por jogo e R$ 859 de renda


A VIDA DURA DO ATACANTE JORGE, O CRAQUE DA PARTIDA

Do lado do Mauaense, a coisa não vai muito melhor. O grande destaque da partida, o atacante Jorge de Araújo, de 26 anos, fez o gol de cobertura, e deu trabalho ao time adversário, com dribles, pivôs bem feitos e belas jogadas. Mas ele não conseguiu ir além no futebol profissional e agora o que o aguarda parece ser mais uma vez a Segunda Divisão paulista, pela qual disputou o campeonato deste ano pelo Mauaense por um contrato de três meses de 800 reais mensais. Que ainda não foram integralmente pagos.

Mas Jorge não desanima: “É aquela coisa. Três meses, mas nesses três meses você tem a chance de mostrar alguma coisa no futebol. É uma coisa precária, uma divisão muito difícil, mas a gente tá aí batalhando para conquistar o melhor. Quem sabe não aparece alguma coisa, alguém me vê jogar e eu posso ir pra um clube melhor?”.

O último salário dos três prometidos para o campeonato passado está atrasado, assim como o dos colegas de clube, que ganharam ainda menos: R$ 678,00, o salário mínimo. “Temos a promessa do nosso presidente, que falou que tá vindo o dinheiro, mas a gente continua esperando”, diz Jorge.

Para se manter num cenário de tanta instabilidade Jorge arrumou um bico: “Hoje eu tô trabalhando numa escolinha de futebol, dando aula pras crianças. Sou técnico de um time infantil também, fiz uns cursos aí. E tem a várzea né?”, conta. “Não gostaria de jogar na várzea, mas lá é dinheiro garantido, dinheiro na mão. Termina o jogo e tá lá o seu dinheirinho dentro do envelope. Aqui no profissional às vezes o mês tem 60, 80 dias. Então a gente não pode contar com o salário do mês. Aí a gente às vezes vai pra várzea, vai pra longe, faz de tudo aí pra se manter”, explica, referindo-se aos campeonatos de futebol amador, assim apelidados em São Paulo porque começaram a ser disputados nas várzeas dos rios paulistanos.

Hoje há campeonatos de várzea bem estruturados, como a Copa Kaiser, o principal campeonato amador da capital paulista que neste ano contou com 192 equipes em jogos que foram de março a outubro. “Na várzea, eu já peguei cinco mil pra assinar e mais 250 reais por jogo. É um dinheiro bom e sempre vem conforme o combinado. No profissional, muitas vezes eles te prometem um contrato e só pagam uma parte. O que vale mais a pena?”, pergunta Jorge, que foi campeão da Copa Kaiser deste ano pelo Leões da Geolândia, da Vila Medeiros, zona norte de São Paulo.

Como as premiações são pagas em dinheiro vivo, fica sempre a dúvida sobre suas origens. Mas fato é que a várzea funciona como alternativa ao vácuo de organização das divisões menores do futebol profissional. Jogadores que chegaram à Seleção Brasileira, como o atacante Leandro Damião, do Internacional, o volante Elias, atualmente no Flamengo, e o meia-atacante Denílson, este pentacampeão com o Brasil em 2002, jogaram a Copa Kaiser.

A falta de alternativas para quem busca ser profissional de futebol é tão grande para que os que ficaram fora das categorias de base dos times profissionais que alguns chegam a pagar – literalmente – para jogar, como conta Jorge, que já recebeu a indecente proposta. “Eu estava em Santa Catarina e um cara me pediu dez mil pra me colocar num time da Segunda Divisão do Catarinense. Aí eu fui pra lá, eu estava com dinheiro, mas eu vi que era uma barca furada e desisti”, diz. “Tenho amigos, por exemplo, que pagaram dez mil por um contrato de seis meses num clube. Só que aí eles vão lá, jogam, e acabam recebendo esses dez mil de volta nesses seis meses. Depois você vai embora, não é aproveitado. Fica tipo uma bagagem. Aí o cara fala: ‘Ah, eu joguei no clube tal…’ Jogou nada. Jogou porque pagou pra jogar”, afirma.


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Matias, técnico do Mauaense, conversa com dirigente na beira do estádio Pedro Benedetti


NA BASE DA PIRÂMIDE, TIMES SEM DINHEIRO NEM INCENTIVO

Por sua vez, o Mauaense sofreu um fracasso retumbante na Segunda Divisão Paulista. Nos dez jogos que disputou, perdeu oito e empatou dois, ficando em último lugar do grupo 08. Em termos de arrecadação, o desempenho também foi ruim: média de 96,5 torcedores pagantes por partida em casa e renda média por partida de R$ 859,25.

“O Mauaense precisaria de uns R$ 70 mil por mês para bancar atletas, comissão técnica, médico, material esportivo, viagem essas coisas. Eu gastei R$ 20 mil, que era o que eu consegui por um empréstimo com um amigo, de última hora. Tá muito deficitário, né? Relutei esse ano para não entregar o time na mão de um empresário”, conta o presidente do Mauaense, Marco Antonio Capuano, conhecido como Quinho.

Diante da fragilidade de muitos clubes profissionais e das cifras que giram em torno do negócio-futebol, muitos investidores se aproximam dos clubes menores. “Chega um empresário com dinheiro, sonhando com uma transação milionária [de algum jogador], e começa a arcar com as despesas do clube. Às vezes vende o jogador, o clube não leva nada, e depois de um tempo vai embora, geralmente deixando dívida pro clube pagar, como já fizeram com o Mauaense, principalmente trabalhista, porque os contratos são firmados com o clube e não com ele,”, resume o dirigente.

Na opinião de Quinho, o que falta para o Mauaense é visibilidade – termo que ele repetiu pelo menos quatro vezes na entrevista. “Quando as pessoas não enxergam aquilo que você está fazendo, fica difícil. Como eu vou chegar numa empresa aqui de Mauá se eles falam: ‘ah, mas você não dá retorno’? É isso que a gente precisa: retorno. Precisa a prefeitura de Mauá nos ajudar, abraçar o time da cidade, e a mídia local e a própria federação paulista fazerem um esforço maior de divulgação do que se faz aqui na Segunda Divisão”, opina. “A falta de público é falta de iniciativa”, diz. De quem? “De todos, mas principalmente da mídia, do poder público e da federação paulista”, resume.

A Pública procurou a Federação Paulista de Futebol para falar nessa reportagem, mas não obteve retorno da assessoria de imprensa.


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De acordo com dados da CBF, em 2010, 60% dos atletas profissionais registrados ganhavam até um salário mínimo


QUANTO MAIS LONGE DO CENTRO, MAIS DIFÍCIL O SONHO

Em estados distantes dos grandes centros, os jogadores também precisam se virar ainda mais para jogar o ano inteiro. “Quando termina o campeonato paraense aqui em Belém (PA), se a gente não consegue renovar o contrato, temos que ir para Macapá (AP) e jogar os outros três meses”, conta o belenense José Romeu Tavares, de 28 anos. O campeonato paraense foi de janeiro a junho e o amapaense, de julho a outubro. “A partir de dezembro começa a pré-temporada para o paraense, aqui em Belém e [os clubes] começam a contratar. Aí os jogadores voltam para não ficarem parados.”

Isso significa que muitos jogadores não têm férias entre as temporadas. Romeu se machucou no fim de 2012 e teve que passar por uma cirurgia no joelho. Ele ficou se recuperando durante o primeiro semestre deste ano, e jogou apenas o segundo, pelo Ypiranga, de Macapá. “Graças a Deus tive ajuda de amigos, da família que me ajuda e tenho um dinheiro que eu sempre deixo guardado, porque a gente nunca sabe.” Agora já retornou para Belém para a pré-temporada.

Situações como essa são comuns no Pará. O zagueiro Bruno Oliveira de Andrade, colega de Romeu no Ypiranga, não conseguiu firmar contrato para jogar no primeiro semestre. “Temos que dar uma economizada para sobreviver esses meses. Trabalhei em várias coisas: como motorista, até ajudante de pedreiro para ganhar um dinheirinho.” Romeu conta que muitos amigos desistiram do futebol porque precisavam sustentar suas famílias. Mas Bruno não quer seguir esse caminho. “Quando você fica três, quatro meses parado, passam várias coisas na cabeça da pessoa. Já pensei várias vezes em parar por causa da esposa, do filho. Continuo porque tenho condições de chegar em um lugar melhor. No futebol, do dia para a noite podem acontecer coisas melhores, você pode ficar bem. Meu sonho é ser campeão por uma equipe grande do Rio, de São Paulo, até de fora, conseguir sair daqui do estado.”

Em 2013, o Ypiranga teve apenas 23 jogos, dos quais 3 foram amistosos 20 oficiais (14 no estadual e 6 na Série D do Campeonato Brasileiro). O time sobrevive com uma média de 8 a 10 mil reais mensais que recebe da loteria esportiva Time Mania, além de um repasse anual de R$ 50 mil do estado do Amapá.

“Muita coisa o presidente tem que tirar do bolso”, diz o diretor administrativo do clube, Claudio Celio Góes Conrado. “Se não tem campeonato, não tem como manter o time [durante o ano]. A gente monta a equipe para jogar três meses se for só o estadual, e cinco meses se tiver a série D do Brasileiro”. Como na maioria dos times pequenos, os contratos de jogadores e patrocinadores vigoram apenas durante os campeonatos. “É complicado conseguir patrocinadores pela questão da credibilidade que a gente foi perdendo ao longo dos anos”, conta o dirigente. O time, fundado em 1963, possui sete títulos do campeonato amapaense, mas não ganha desde 2004.


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Meia-atacante Eddy Rocha, do time do SAPESP, se prepara para bater um pênalti


FRANCESES EM SERGIPE?

Na segunda divisão de Sergipe, a situação é semelhante. “Os nossos campeonatos não são rentáveis, não temos patrocínios para realizar a competição, não temos grandes públicos nos estádios. O campeonato não é atrativo em termos de jogadores, já que a média salarial é baixa. Falta credibilidade frente aos torcedores porque não tem boas equipes”, descreve Diogo Andrade, diretor do departamento técnico da Federação Sergipana de Futebol. De acordo com ele, a média de público para jogos da Primeira Divisão do campeonato estadual varia entre 800 a 1000 pagantes, enquanto na Segunda Divisão é de 150 a 200 pessoas.

Fundado há 96 anos em Maruim, no interior de Sergipe, o Maruinense teve apenas 8 jogos em 2013. Com R$ 50 mil reais de patrocínio para todo o ano, o clube tenta diversificar sua receita fazendo parcerias com times de outros estados e busca outras fora do país. “Nós estamos firmando um projeto de clube-escola, em que vamos receber jogadores franceses, treinar e mandar pra fora. Além disso, estamos negociando com amigos meus na Ponte Preta, na Portuguesa e no Palmeiras para mandarem jogadores de 20, 21 anos que não estão sendo usados nos times de base”, explica Manoel Rodrigues Neto, presidente do clube. Ele conta que o time já revelou jogadores conhecidos como o atacante Oséas, que jogou pelo Atlético Paranaense, Cruzeiro e Palmeiras, na equipe que conquistou a Libertadores, em 1999.

“Meu sonho é colocar o Maruinense na série B do Campeonato Brasileiro, em um nível mais alto”, conta o dirigente do time que hoje disputa a Segunda Divisão do campeonato sergipano. Mas, para o zagueiro Felipe Severo Santana, de 25 anos, que já jogou no São Caetano e no Atlético Paranaense, o clube precisa melhorar sua estrutura para fazer frente aos times de elite. “Nesses times tinha mais profissionais, alimentação de qualidade, já aqui é meio carente. Aqui tem que ser guerreiro”, opina o jogador, que já trabalhou até em uma loja de sapatos enquanto ficou parado no futebol. “Já pensei em desistir muitas vezes. Futebol é injusto demais”, afirma.

Para Diogo Andrade, da federação sergipana, o maior problema é a incompetência administrativa” dos clubes. “Os clubes precisam ir atrás de patrocínio e trabalhar dentro do que arrecadaram, fazendo um orçamento. Aqui, primeiro se forma a equipe, pra depois pensar em uma forma de pagar.” Para ele, os campeonatos deveriam ter menos equipes que deveriam passar por um filtro das federações “exigindo um profissionalismo, para que não acumulem dívidas com os funcionários”, diz. “Eu já vi clube lamentando porque ia para a decisão da segunda divisão campeonato porque ia ter mais 15 dias de despesas”, relata, inconformado. Ele cita como bom exemplo de administração o caso do River Plate de Sergipe, que diante da possibilidade de disputar o Campeonato Estadual, a Copa do Nordeste e a Copa do Brasil, desistiu dos campeonatos oficiais por falta de condições financeiras.

Em termos financeiros, explica Diogo, vale mais a pena disputar o campeonato sergipano do que o nacional. “O estadual dá vaga para duas competições nacionais: Copa do Nordeste e do Brasil. Jogando dentro do estado a despesa é menor, por isso o lucro é maior do que no Brasileiro. E você tem certeza que o campeonato dura de janeiro a maio, pode contratar um atleta sabendo que vai cobrir todas as etapas do contrato do jogador. Já no brasileiro, a primeira fase tem dois meses. Você contrata um jogador por três meses [mínimo exigido pela lei]. Neste mês extra os atletas querem receber, mas o clube está inativo .”

Para ele, compensaria aumentar o número de times na série D ou criar uma série E do Campeonato Brasileiro se a CBF colaborasse. “Nós temos equipes com condições de ingressar em competição nacional, desde que a CBF se comprometesse a cobrir as despesas da competição – transporte, alimentação e hospedagem. Sem isso não há grande vantagem”, diz.

Ele também defende os campeonatos estaduais e regionais e elogia a Copa do Nordeste, bancada pela CBF, em que os 16 clubes recebem uma cota fixa em torno de 345 mil pela participação, mais a renda das partidas: “Um clube de Sergipe não ganha menos do que 500 mil reais em uma competição como essa. Ela serve para engrandecer os times da região”, diz, lembrando ainda que o campeão da Copa do Nordeste tem vaga garantida na Copa Sul-Americana. “É um caminho curto para uma equipe de menor porte chegar a uma competição internacional”, diz.

De acordo com o site Esporte Nordeste, o campeão receberá cerca de R$ 1,5 milhões, incluindo a cota de participação, a classificação até a final e a premiação.Em 28 de novembro, a CBF divulgou a tabela da Copa Verde, que será disputada por 6 clubes das regiões Norte, Centro-Oeste e Sudeste. O vencedor da competição, que acontece entre fevereiro e abril de 2014, também ganhará vaga na Copa Sul-Americana.

A CBF foi procurada pela reportagem da Pública, mas disse que não iria se manifestar.


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Jogadores do Mauaense se preparam para enfrentar o time da Sapesp. Na base da pirâmide do futebol, a realidade é outra


PAULO ANDRÉ SABE O QUE É SOFRER NO FUTEBOL

Casos como esses mostram a necessidade de mudanças urgentes no futebol brasileiro, defendidas pelo Bom Senso FC, entre elas duas de interesse direto dos personagens desta reportagem: o aumento de jogos para os clubes pequenos (estendendo o calendário de atividade desses jogadores) e a instituição de um fair play financeiro, com a inclusão de leis mais severas para clubes que descumprirem suas obrigações contratuais. Só assim, seria possível mudar a história da grande maioria dos jogadores brasileiros, que alguns líderes do Bom Senso, como o jogador Paulo André, zagueiro do Corinthians, não esquecem.

“Eu morava num sítio que ficava quatro quilômetros da cidade, dormia num galpão com mais 30 outros sonhadores, aspirantes a jogadores de futebol. A nossa alimentação era precária: arroz, feijão e salsicha todo dia. A estrutura de treino era qualquer pedaço de grama que tinha na cidade. Nas viagens longas que se faziam pelo interior do estado, o ônibus quebrava e a gente chegava em cima da hora, atrasado pra jogar. Eu ganhava um salário mínimo, que era de 180 reais, e atrasava”.

A realidade vivida pelo craque 11 anos atrás, quando defendia as cores do Águas de Lindoia Esporte Clube, não mudou para os clubes menores, que ainda sofrem com esse vácuo de atuação de quem organiza o futebol brasileiro, como ele diz. “Isso não é fomentar futebol e sua prática, isso é expor trabalhadores a condições de risco. Isso é vender uma ilusão de ser jogador de futebol a milhares de pessoas, milhares de atletas, que vivem como verdadeiros bóias-frias do futebol. Vivendo do futebol três, quatro vezes no ano e depois tendo que encontrar outra divisão”, reflete.

“Queremos a redução de jogos dos times da Série A e aumento do número de jogos de todos os outros times brasileiros”, explica Paulo André, que vê os jogadores dos grandes times sobrecarregados de jogos e os dos pequenos sem-calendário. “A gente acredita que os clubes têm que jogar no mínimo 36 partidas e no máximo 72 partidas no ano. Qualquer modelo que consiga inserir essas duas premissas já é muito melhor do que o que está aí”, diz. “O que tem feito a CBF e as Federações sim, é um assassinato contra os clubes do interior.”

“Não há necessidade de que para que o pequeno exista, ele deva jogar contra o grande”, destaca. “Essa é uma grande mentira que tem emperrado o desenvolvimento dos pequenos. Hoje, no estado de São Paulo, que é o estado mais importante do país no futebol, a gente conta com 105 clubes. Desses 105, 85 não jogam contra os grandes porque fazem parte da Série A2, da Série A3 e da Série B do Paulista. E eles continuam sobrevivendo. Assim como os 7 clubes que jogam a Série A1 e não disputam competições nacionais. O que a gente pergunta para essas pessoas que defendem esse modelo é: qual é a diferença estrutural e financeira dos sete clubes que jogam a A1 para os 85 clubes que não jogam a A1? Não existe diferença. Todos eles estão se matando para tentar sobreviver”, conclui.

Por meio do Bom Senso FC, Paulo André e outros jogadores da “elite” também aproveitam sua visibilidade para denunciar os baixos salários e o atraso nos pagamentos que atingem a maior parte dos atletas. De acordo com dados da CBF, em 2010, 60% dos atletas profissionais registrados ganhavam até um salário mínimo, na época, R$ 510. Apenas 4,3% ganhava acima de 20 salários mínimos. Na lista dos 20 jogadores mais bem pagos no Brasil, feita pela Pluri Consultoria a pedido da revista Época Negócios, pelo menos oito fazem parte do Bom Senso FC. Enquanto D’Alessandro (Internacional), recebe o melhor salário entre eles, cerca de R$ 7,5 milhões por ano, os jogadores do Mauaense ganham o correspondente a 0,1% desse valor – R$ 8.136 por ano, um salário mínimo por mês.




O blog Copa Pública é uma experiência de jornalismo cidadão que mostra como a população brasileira tem sido afetada pelos preparativos para a Copa de 2014 – e como está se organizando para não ficar de fora.



http://www.apublica.org/2013/12/os-boias-frias-futebol/


:vinho:
 
Última edição:
O texto já tem dois anos, mas continua atual:


via http://exame.abril.com.br/rede-de-b...07/a-cultura-do-empreendedorismo-de-boutique/


A cultura do empreendedorismo de boutique
por Wagner Martins

[video=youtube;iw0VSOxgHB0]http://www.youtube.com/watch?v=iw0VSOxgHB0[/video]


O empreendedorismo também tem o seu lado nefasto. O lado que beira a indústria da auto-ajuda. Criou-se um culto ao “sucesso da captação” de venture capital. E nos eventos de internet como o LeWeb se fala muito de “quanto você captou até agora?”, “qual o seu head-count?” e “você venderia para o Google? Ou prefere esperar um IPO?”… Perguntas ensaiadas para saber se o “empreendedor” também ensaiou bem o seu discurso escrito no Busness Plan.

O palco princpal de hoje do LeWeb foi uma seqüência destes exemplos. SoundTracking, Uber, TaskRabbit, Path, Oink, Flipboard… “Pop-Stars” das start-ups falando mais de quanto captaram do que como pretendem tornar a sua idéia economicamente viável. Idéias geniais, conceitos ousados e produtos bem executados. E tudo dentro de um discurso inspirador: “se eu consegui, você consegue também”.

Daí aparece um cara que é a anti-auto-ajuda. Um garoto que não coloca a palavra “empreendedor” na sua bio do Twitter. Um sujeito que simplesmente faz, sem se preocupar em preparar o discurso de start-up da moda.

Andrey Andreev, do Badoo. Um site / aplicativo móvel que permite que você conheça pessoas que estão por perto.

Você abre o telefone, marca os parâmetros que interessam e começam a aprecer fotos de perfis na tela. Ordenados pela distância que estão de você. Daí você diz se “conheceria” ou “não conheceria”. Se nesta “roleta russa” o desejo for mútuo, fica aberta a chance para ambos “expandirem o seu círculo social”. Site de encontros? Ele diz que não. Pelo menos, dá para se enganar achando que não é.

Idéia simples. Nenhum conceito revolucionário. Simplesmente a internet sendo usada pro que sempre foi usada desde a época do IRC: “conhecer” gente.

Monetização? Ele diz como ganha dinheiro sem enrolar. Sem dizer que “primeiro está construindo uma comunidade”.

As pessoas pagam (e bem) para aparecerem em destaque, aumentando suas chances de “conhecerem” mais gente.

Um garoto novo, com inglês ruim e timidez visível. Nada sedutor. Mas já são 400 funcionários e 130 milhões de usuários no mundo (e o Brasil é seu maior mercado). Ainda no início, vendeu 10% da empresa por 30 milhões de dólares. Hoje, com 4 anos operando, já fatura 150 milhões de dólares. E quer faturar 100 bilhões.

De longe, o painel que menos agradou o público. Uma pena. O russo prefere fazer, em vez de se vender e colocar na cabeça de todos ali que com uma idéia banal dá pra fazer muito dinheiro. Não ajudou nada no culto da formação de “empreendedores em série”. Por isso mesmo eu recomendo.



via http://exame.abril.com.br/rede-de-b...07/a-cultura-do-empreendedorismo-de-boutique/
 
O colega Camilo já havia postado o link deste artigo em um tópico no geral na época das manifestações, mas eu o havia perdido. Felizmente, fazendo uma limpa nos bookmarks ele estava salvo aqui no session manager e consegui o link original do texto novamente.

Mentiras sociais

[h=2]A quantidade de informação falsa circulando na rede é imensa. Em algum momento, precisaremos de filtro.[/h]
RIO - Nos últimos dois meses, por conta das manifestações, os brasileiros começaram a prestar mais atenção na informação que vem das mídias sociais.
Em blogs, via Twitter, sites de vídeo ou Facebook, muita notícia circulou. As fontes, inúmeras. Imprensa tradicional, blogueiros com maior ou menor grau de influência, grupos ativistas e, até mesmo, informação sem procedência definida. Numa redação como a do GLOBO, parte de nosso trabalho é acompanhar toda pista que pode gerar notícia.
O grande furo pode vir de qualquer parte: tanto de um telefonema anônimo quanto de uma ligação da presidente da República. Mas é impressionante o quanto daquilo que circula nas redes é, simplesmente, falso.

Dois exemplos claros. O primeiro, muito fácil de confirmar. O governador do Rio, Sérgio Cabral Filho, seria casado com a filha de um dos principais empresários de ônibus do Rio. Não haveria qualquer crime aí. Uma das benesses de viver numa democracia ocidental no século XXI é que, cada vez mais, podemos realmente casar com quem quisermos. Só que é mentira. A história já circula há mais de ano, às vezes mais, outras menos. Não morre. É inteiramente falsa. Outra envolve o presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa. Ele teria recebido uma imensa quantia de dinheiro como professor da UERJ, embora há muito licenciado para presidir o STF. Em algumas versões, a história vem até com documentos anexos. É mentira.

Não importa qual a simpatia ou a antipatia que possamos ter por uma ou outra figura pública. A essência do jornalismo é partir de fatos cuidadosamente comprovados.
Não é um diploma que faz o jornalista. Não é o lugar onde trabalha. É o rigor. Quando a comparação entre dois vídeos tentou comprovar que um policial militar infiltrado teria lançado um coquetel molotov durante uma das manifestações no Rio, passamos mais de um dia debruçados sobre ambos os filmes. Quadro a quadro, consultando peritos, tentando identificar junto à PM os homens em roupas civis que pareciam membros da corporação, traçando seu comportamento. No fim, os vídeos mostravam duas pessoas diferentes.

Não é um fenômeno único ao Brasil. Quando bombas explodiram durante a Maratona de Boston, circularam inúmeras histórias falsas. Entre elas, uma tentava, comparando foto a foto, relacionar pessoas inocentes com os terroristas. Algo assim pode fazer um estrago grande na vida de uma pessoa. Quando se discute uma guerra entre a nova e a velha mídia, o argumento está deslocado. Esta é uma discussão de todo irrelevante. Tenta trazer, para o centro da conversa, a tecnologia na qual cada um se baseia.
Para o jornalismo, o que importa não é o meio utilizado para veicular informação, não é a idade de quem o pratica, ou mesmo a origem profissional. O que importa é apenas o jornalismo. E jornalismo dá trabalho de fazer além de, infelizmente, custar muito tempo e dinheiro.

No início do século, havia uma forte discussão a respeito de blogueiros. Blogs independentes, um exército de profissionais liberais que, à noite, de pijamas, apurariam e contariam nova informação, talvez substituíssem o papel da imprensa tradicional. Não aconteceu. Grupos que nasceram deste processo, dos quais o mais conhecido é o Huffington Post, acabaram se organizando como a imprensa tradicional. Reuniram redações, com editores experientes, repórteres que passam parte do dia pendurados no telefone, a outra parte na rua com gravador ou câmera na mão. O produto final que fazem tem um sabor diferente do jornalismo tradicional. Talvez sejam até mais íntimos do mundo digital. Mas o método de fazer jornalismo, de levantar informação, confirmar, pacientemente averiguar, é o mesmo, bom e velho.

As manifestações que encheram as ruas brasileiras foram produto das mídias sociais. Quem apenas se informou a respeito delas pelas redes, porém, recebeu um misto de suposições, verdades, mentiras. Quem filtra o todo? Não é uma pergunta que tenha resposta. Minha suposição é bem mais simples. O jornalismo tradicional não morrerá. Porque sem rigor informativo nenhuma democracia se sustenta.

http://oglobo.globo.com/tecnologia/mentiras-sociais-9498265
 
O colega Camilo já havia postado o link deste artigo em um tópico no geral na época das manifestações, mas eu o havia perdido. Felizmente, fazendo uma limpa nos bookmarks ele estava salvo aqui no session manager e consegui o link original do texto novamente.
Mentiras sociais

[h=2]A quantidade de informação falsa circulando na rede é imensa. Em algum momento, precisaremos de filtro.[/h]
RIO - Nos últimos dois meses, por conta das manifestações, os brasileiros começaram a prestar mais atenção na informação que vem das mídias sociais.
Em blogs, via Twitter, sites de vídeo ou Facebook, muita notícia circulou. As fontes, inúmeras. Imprensa tradicional, blogueiros com maior ou menor grau de influência, grupos ativistas e, até mesmo, informação sem procedência definida. Numa redação como a do GLOBO, parte de nosso trabalho é acompanhar toda pista que pode gerar notícia.
O grande furo pode vir de qualquer parte: tanto de um telefonema anônimo quanto de uma ligação da presidente da República. Mas é impressionante o quanto daquilo que circula nas redes é, simplesmente, falso.

Dois exemplos claros. O primeiro, muito fácil de confirmar. O governador do Rio, Sérgio Cabral Filho, seria casado com a filha de um dos principais empresários de ônibus do Rio. Não haveria qualquer crime aí. Uma das benesses de viver numa democracia ocidental no século XXI é que, cada vez mais, podemos realmente casar com quem quisermos. Só que é mentira. A história já circula há mais de ano, às vezes mais, outras menos. Não morre. É inteiramente falsa. Outra envolve o presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa. Ele teria recebido uma imensa quantia de dinheiro como professor da UERJ, embora há muito licenciado para presidir o STF. Em algumas versões, a história vem até com documentos anexos. É mentira.

Não importa qual a simpatia ou a antipatia que possamos ter por uma ou outra figura pública. A essência do jornalismo é partir de fatos cuidadosamente comprovados.
Não é um diploma que faz o jornalista. Não é o lugar onde trabalha. É o rigor. Quando a comparação entre dois vídeos tentou comprovar que um policial militar infiltrado teria lançado um coquetel molotov durante uma das manifestações no Rio, passamos mais de um dia debruçados sobre ambos os filmes. Quadro a quadro, consultando peritos, tentando identificar junto à PM os homens em roupas civis que pareciam membros da corporação, traçando seu comportamento. No fim, os vídeos mostravam duas pessoas diferentes.

Não é um fenômeno único ao Brasil. Quando bombas explodiram durante a Maratona de Boston, circularam inúmeras histórias falsas. Entre elas, uma tentava, comparando foto a foto, relacionar pessoas inocentes com os terroristas. Algo assim pode fazer um estrago grande na vida de uma pessoa. Quando se discute uma guerra entre a nova e a velha mídia, o argumento está deslocado. Esta é uma discussão de todo irrelevante. Tenta trazer, para o centro da conversa, a tecnologia na qual cada um se baseia.
Para o jornalismo, o que importa não é o meio utilizado para veicular informação, não é a idade de quem o pratica, ou mesmo a origem profissional. O que importa é apenas o jornalismo. E jornalismo dá trabalho de fazer além de, infelizmente, custar muito tempo e dinheiro.

No início do século, havia uma forte discussão a respeito de blogueiros. Blogs independentes, um exército de profissionais liberais que, à noite, de pijamas, apurariam e contariam nova informação, talvez substituíssem o papel da imprensa tradicional. Não aconteceu. Grupos que nasceram deste processo, dos quais o mais conhecido é o Huffington Post, acabaram se organizando como a imprensa tradicional. Reuniram redações, com editores experientes, repórteres que passam parte do dia pendurados no telefone, a outra parte na rua com gravador ou câmera na mão. O produto final que fazem tem um sabor diferente do jornalismo tradicional. Talvez sejam até mais íntimos do mundo digital. Mas o método de fazer jornalismo, de levantar informação, confirmar, pacientemente averiguar, é o mesmo, bom e velho.

As manifestações que encheram as ruas brasileiras foram produto das mídias sociais. Quem apenas se informou a respeito delas pelas redes, porém, recebeu um misto de suposições, verdades, mentiras. Quem filtra o todo? Não é uma pergunta que tenha resposta. Minha suposição é bem mais simples. O jornalismo tradicional não morrerá. Porque sem rigor informativo nenhuma democracia se sustenta.

http://oglobo.globo.com/tecnologia/mentiras-sociais-9498265
Nem lembrava. :haha:

Bom texto, realmente. Valeu por recuperá-lo.

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Tigres gaúchos
por Juremir Machado da Silva

Eu adoro ler os viajantes que estiveram no Rio Grande do Sul no século XIX. De repente, dou um salto acrobático e pego na estante “Notícia Descritiva da Província do Rio Grande de S. Pedro do Sul”, do francês Nicolau Dreys. Ele viveu em Porto Alegre de 1817 a 1825. Os viajantes revelam coisas que muitos nem imaginam. Por exemplo, como os escravos eram maltratados por aqui. Não vou falar disso hoje. No livro de Dreys o que mais me chama atenção é a parte sobre zoologia. Fico encantado.

Acontece que sou anacrônico: acredito em verdade. Sou pósmoderno. A pós-modernidade é injustiçada. Não diz que a verdade inexiste. Exige uma prova mais rigorosa para aceitar algo como verdade. Não aceita a teoria do domínio do fato. A pós-modernidade começa com Agripa, o cético: o que prova que uma prova
é uma boa prova? Quem diz que a verdade não existe, obviamente, contradiz-se. O tribunal da pós-modernidade é exigente. Só acata como verdade aquilo que passa por rígido teste de demonstração. Caro leitor, pare de tremer. A palavra pós-modernidade não exige um doutorado para ser citada. Não é preciso ser especialista em Agripa para entender a citação feita aqui. Tudo é simples. Relaxe. Goze. Leia.

Dreys me deslumbra com suas descrições minuciosas: “Os tigres são numerosos no Rio Grande, como em todas as vastas planícies da margem setentrional do Rio da Prata; eles têm deixado, é verdade, as imediações das vilas; na medida em que a população se adianta, eles recuam, como as tribos selvagens, dos indígenas; eles, assim como estas, não cedem o terreno, senão passo a passo; rodeiam escondidos as habitações dos homens...”. Como bom pós-moderno, pergunto-me: o que é um tigre? O que prova que um tigre é um tigre e não apenas uma reles onça faminta?

O zeloso Dreys dá mais detalhes: “Dizem que o fogo afugenta o tigre (...) É opinião constante entre os viajantes que o tigre observa uma certa graduação no ímpeto dos seus apetites cruéis; dizem que, achando facilidade relativa, o tigre atirar-se-á primeiro ao bruto, depois ao negro e por último ao branco”. Como se
vê, o tigre gaúcho era racista. Ou não era? Por que preteria os franceses, os alemães e os portugueses? Preocupado com a prova do que dizia, Dreys aventura-se: “Se há muitas experiências, em que se fundamente semelhante distribuição, não o sabemos; mas o que podemos afirmar é que, em nossas repetidas viagens
por meio daqueles campos, era custoso determinar o negro a ir só cortar lenha no capão vizinho, alegando sempre aquela funesta preferência por estar acompanhado”. Uau!

Que senso de observação. O andarilho francês comeu carne de tigre. Achou o gosto semelhante ao da vitela. Que comparação faria o “tigre” gaúcho se comesse carne de francês? Acharia, como dizem os palomenses sobre certos bichos, uma carne catinguenta? Sei lá. Sei apenas que Dreys me faz pensar sobre provas, tigres, gostos, carnes e verdades históricas. Ele viu tigre ser laçado. Apanharam 14. Foi uma churrascada farta e feliz.



Fonte: edição impressa do Correio do Povo, 16/12/13.
Blog do autor: http://www.correiodopovo.com.br/blogs/juremirmachado/
 
Apenas lidem com este texto:

via http://zerohora.clicrbs.com.br/rs/c...por-que-a-guerra-as-drogas-faliu-4371743.html


Por que a guerra às drogas faliu?
jornalista argumenta que repressão corrói orçamentos sem avanços visíveis
por Leandro Demori



Carmelo González mergulha o dedo na solução cáustica antes de enfiar na boca. A mistura está justa. No tanque improvisado com tábuas e lona preta, folhas de coca se misturam a gasolina, solventes, ácido sulfúrico e cal que lutam contra as moléculas da planta para extrair dela o princípio ativo mais puro daquele mundo: C17, H21, NO4 – o alcaloide da cocaína. A mistura tóxica usada para sintetizar o ouro branco da floresta é despejada no solo e contamina tudo o que toca. Carmelo González será morto por traficantes no dia em que desistir de trabalhar com a coca. Carmelo González será morto pelo exército quando for pego trabalhando com a coca. O destino não lhe reservou muitas opções.

Em Roma, os olhos dos agentes aduaneiros do aeroporto intercontinental se movem com esperteza própria. Os homens dedicados a coibir a entrada de drogas no país revistam turistas que desembarcam todos os dias. Rotina imutável: apreender, essencialmente, cocaína – que cruza meio mundo camuflada em perucas, disfarçada de fartos (e falsos) seios, prensada em saltos de sapatos (embrulhados para presente), misturada em meio a itens de cozinha de uma suposta chef internacional. E engolida em cápsulas, muitas cápsulas. Em poucas horas, estão amontoados na sala da segurança cerca de 15 quilos da droga com pureza laboratorial. Fosse misturada a analgésicos baratos ou pó de parede (ou qualquer coisa, incluindo veneno de ratos), chegaria a 40 quilos para a venda nas ruas; 3 milhões de euros derramados na economia ilegal.

A competência dos agentes do aeroporto romano não esconde o fim de um ciclo: a guerra às drogas, deflagrada há meio século nos Estados Unidos e abraçada pelo Ocidente, faliu. Ricos e poderosos, os traficantes venceram. As divisões de repressão correm atrás de uma máquina de distribuição muito mais rápida e eficiente do que elas. O resultado não deveria causar choque; drogas são produtos, e produtos sempre chegam às mãos dos consumidores. A ilegalidade nunca foi empecilho para a compra e venda de qualquer coisa, desde o álcool – também inutilmente proibido nos EUA de outros tempos – até brinquedos, DVD, azeitonas, cigarros, tomates, seitas filosóficas, religiões.

O orçamento das polícias de todo o mundo é corroído pelo combate às drogas, uma relação custo-benefício desequilibrada e com pouco sentido prático. Dados da ONU falam por si: apenas 5% dos seres humanos usam algum tipo de droga ilícita, a esmagadora maioria para fins recreativos. Viciados? Uma minoria de quase nada. Dos cerca de 230 milhões de consumidores no mundo, só 27 milhões são considerados de risco. Ainda assim, entre eles, a maioria é maluco beleza, gente fumando maconha, a grande preferida da espécie humana: 4% da raça a fuma ao menos uma vez ao ano. Consumidores diários da erva: 0,6% (zero vírgula seis). A cocaína é usada por 0,4% da população mundial. Um sopro estatístico.

Neste momento, 100 homo sapiens adultos estão sendo estudados em uma redoma chamada Terra. Observadores constatam que 42 deles bebem álcool, 25 fumam cigarros, 32 mentem para o imposto de renda e 5 usam algum tipo de droga ilícita, quase todos, a maconha. É mais fácil encontrar, entre esses animais, um viciado em pôquer (acaba de perder a única casa da família no jogo) do que em cocaína.

Proibida nos Estados Unidos nos anos 1930 por causar “crimes, loucura e morte”, a marijuana é o maior dos bodes expiatórios. Caso fosse vendida legalmente no país, ela e outras drogas hoje ilícitas renderiam 46 bilhões de dólares anuais ao governo em forma de impostos. A essa fortuna se somariam os 41 bilhões anuais gastos com força policial nesse jogo de esconde-esconde. Dinheiro que poderia sustentar 15 milhões de estudantes universitários por ano, financiar toda a pesquisa americana para a cura do câncer por uma década ou lançar 60 novas missões espaciais (nem que fosse só pra ouvir o comandante Chris Hadfield cantar Space Oddity).

É fácil encontrar estatísticas provando que o excesso de drogas mata. Segundo a ONU, são 200 mil pessoas por ano. Difícil é encontrar dados globais sobre as mortes causadas pelo tráfico, e não pelo consumo. Diferenciar isso é fundamental. Só no México, anualmente, são mais de 15 mil cadáveres – vítimas de uma violência atroz produzida pela mais sangrenta guerra de nosso tempo. Quantos são os mortos no Brasil? Na Colômbia? No Peru? Em toda a América Latina? Na Ásia?

Quando a Califórnia discutia a aprovação de leis para a venda da maconha, os maiores lobistas contra a legalização investiram pesado: vendedores de armas e aparatos de segurança que faturam com o medo, sindicatos de policiais que aprovam orçamentos para atuar contra traficantes e fazer carreira, indústrias de bebidas alcóolicas que eliminam a concorrência através da lei. Os maiores beneficiários, no entanto, são os próprios traficantes, desejosos de continuar operando em um mercado sem leis onde se pode eliminar um concorrente à bala e onde o aperto na fiscalização não faz baixar o consumo, mas aumentar os preços. Um grande negócio patrocinado pelos congressos.

Pecunia non olet, disseram os antigos romanos. O dinheiro não tem cheiro. Mesmo sem odor, o dinheiro das drogas precisa ser lavado antes de assumir a forma de carros, joias, casas, ações, armas. E, por óbvio, voltar a ser cocaína, heroína, anfetaminas. Máfias antigas reinvestem na própria droga (onde mais lucrariam tanto?). Novas máfias precisam se capitalizar antes de girar a roleta da fortuna, e o fazem praticando sequestros, assaltos, crimes; matando. Gente que não deveria fazer parte desse bilionário mercado de recreação adulta. Estão nele porque os governos decidiram que o ópio de cada um é feio, e que não será vendido com os devidos impostos, controle de qualidade e lucros revertidos ao setor de saúde – para tratar os eventuais excessos e investir na melhoria do sistema. Pacientes de todas as doenças seriam beneficiados com pesquisa e desenvolvimento. Novos tratamentos para diversos males poderiam surgir. Em vez disso, traficantes gastam dinheiro buscando maneiras de fazer com que a mercadoria circule sem ser notada. Abaixo a saúde, e um viva às perucas despenteadas e aos falsos seios entupidos de pó.



via http://zerohora.clicrbs.com.br/rs/c...por-que-a-guerra-as-drogas-faliu-4371743.html
 
Problemas de homens
por José Saramago

Vejo nas sondagens que a violência contra as mulheres é o assunto número catorze nas preocupações dos espanhóis, apesar de que todos os meses se contem pelos dedos, e desgraçadamente faltam dedos, as mulheres assassinadas por aqueles que crêem ser seus donos. Vejo também que a sociedade, na publicidade institucional e em distintas iniciativas cívicas, assume, é certo que só pouco a pouco, que esta vio- lência é um problema dos homens e que os homens têm de resolver. De Sevilha e da Estremadura espanhola chegaram-nos, há tempos, notícias de um bom exemplo: manifestações de homens contra a violência. Até agora eram somente as mulheres quem saía à praça pública a protestar contra os contínuos maus tratos sofridos às mãos dos maridos e companheiros (companheiros, triste ironia esta), e que, a par de em muitíssimos casos tomarem aspectos de fria e deliberada tortura, não recuam perante o assassínio, o estrangulamento, a punhalada, a degolação, o ácido, o fogo. A violência desde sempre exercida sobre a mulher encontrou no cárcere em que se transformou o lugar de coabitação (neguemo-nos a chamar-lhe lar) o espaço por excelência para a humilhação diária, para o espancamento habitual, para a crueldade psicológica como instrumento de domínio. É o problema das mulheres, diz-se, e isso não é verdade. O problema é dos homens, do egoísmo dos homens, do doentio sentimento possessivo dos homens, da poltronaria dos homens, essa miserável cobardia que os autoriza a usar a força contra um ser fisicamente mais débil e a quem foi reduzida sistematicamente a capacidade de resistência psíquica. Há poucos dias, em Huelva, cumprindo as regras habituais dos mais velhos, vários adolescentes de treze e catorze anos violaram uma rapariga da mesma idade e com uma deficiência psíquica, talvez por pensarem que tinham direito ao crime e à violência. Direito a usar o que consideravam seu. Este novo acto de violência de género, mais os que se produziram neste fim-de-semana, em Madrid uma menina assassinada, em Toledo uma mulher de trinta e três anos morta diante da sua filha de seis, deveriam ter feito sair os homens à rua. Talvez 100 000 homens, só homens, nada mais que homens, manifestando-se nas ruas, enquanto as mulheres, nos passeios, lhes lançariam flores, este poderia ser o sinal de que a sociedade necessita para combater, desde o seu próprio interior e sem demora, esta vergonha insuportável. E para que a violência de género, com resultado de morte ou não, passe a ser uma das primeiras dores e preocupações dos cidadãos. É um sonho, é um dever. Pode não ser uma utopia.
In O Caderno 2, 27 de julho de 2009


via http://caderno.josesaramago.org/160102.html
 
Ndongo quer ser titular
A viagem e o sonho de um imigrante senegalês em terras gaúchas
por Felipe Prestes

http://revistapiaui.estadao.com.br/edicao-87/esquina/ndongo-quer-ser-titular



O meio-campista balançou a cabeça enquanto conversava em francês com o goleiro. A palavra imbécile chamou a atenção de quem não entendia o idioma. Referiam-se ao treinador. O volante do time Clandestino começou a partida no banco de reservas, jogou metade do primeiro tempo, voltou ao banco no intervalo e depois entrou novamente – as partidas de várzea não respeitam convenções. “Assim é difícil”, argumentou, justificando sua má atuação.

Num sábado de novembro, o meio-campista Ndongo (pronuncia-se Nongo) Ndiaye sacolejou durante vinte minutos no velho Passat de Paulinho, um dos líderes do Clandestino, para chegar ao estádio do Esporte Clube Cruzeiro, na zona rural de Carlos Barbosa, município a pouco mais de 100 quilômetros de Porto Alegre. Mas a jornada do senegalês Ndongo até essa região de colonização italiana no sul do Brasil foi muito mais longa e aventurosa.

Ele juntou dinheiro durante três anos para sair de Cité Fadia, bairro na periferia de Dacar. Pagou não só as passagens, mas os coiotes que “organizaram” a viagem. Há cinco meses, deixou o Senegal de avião rumo à Espanha, e dali voou até o Equador. Depois, foi de ônibus até a fronteira do Peru com o Brasil, chegando a um campo de imigrantes no Acre, onde se juntou a centenas de haitianos, dominicanos e alguns africanos que aguardavam precariamente a oportunidade que outrora buscariam no Hemisfério Norte.

Por fim, Ndongo foi ao encontro de amigos senegaleses que já trabalhavam em Garibaldi, município gaúcho vizinho a Carlos Barbosa. Ali, produzem carne halal, de animais abatidos segundo os preceitos muçulmanos. No frigorífico em que se empregou logo após sua chegada, Ndongo mata cerca de 9 mil frangos por dia com um facão. São quarenta aves por minuto (num abate convencional chega-se até o dobro disso), numa jornada quevai das quatro da manhã às três da tarde.

A degola manual dos animais precisa ser feita de maneira incisiva, para amenizar seu sofrimento, conforme determina o Corão. Enquanto faz o trabalho, Ndongo tem que repetir as expressões “Deus é grande” e “Em nome de Deus” – em árabe, claro. O sangue das aves deve ser escoado totalmente, por ser visto como transmissor de doenças.

Das exportações de frango brasileiras, 45% vão para países de maioria muçulmana, especialmente do Oriente Médio. Diante da tendência, os abatedouros locais têm recrutado cada vez mais seguidores do Islã. Ndongo é contratado da Central Islâmica Brasileira de Alimentos Halal, braço operacional da Federação das Associações Muçulmanas do Brasil, sediado em São Paulo e especializado nessa forma de abate.

Em Garibaldi, cidade com canteiros de flores nas avenidas e bem preservados casarões do início do século XX, imigrantes muçulmanos de vários países vêm chegando desde o início da década – os senegaleses já são uns vinte e poucos, segundo contagem dos próprios. As indústrias de laticínios, metalurgia e viticultura da região atraíram também trabalhadores haitianos e chineses.

Numa lanchonete de Garibaldi, me disseram que, se eu quisesse entrevistar imigrantes, bastaria sair à rua durante o dia para me deparar com “tocos de lenha preta”. Enquanto dirigia o Passat até a peleja, Paulinho contou que, aos poucos, o preconceito contra os seguidores de Alá vai cedendo. “As pessoas estão vendo que eles não bebem, não arrumam confusão, não roubam. Não sei se a religião deles é melhor, mas eles seguem muito mais que nós.”

Antes de rumar ao estádio, Ndongo narrou sua aventura em inglês, na casa alugada que divide com quatro conterrâneos. Em Dacar, o jovem de 24 anos intercalava o trabalho num supermercado com treinos. Passou por clubes pequenos da capital – o principal deles, o ASC Cambérène, joga na série B do Senegal. No Brasil, ele mantém a jornada dupla. Depois que encerra o trabalho no frigorífico, vai treinar no Garibaldi, que joga na terceira divisão gaúcha. Como ainda não conseguiu uma chance para estrear, mata a fome em jogos amadores.

O senegalês não considera os 930 reaispagos pelo frigorífico um bom salário, mas está mais satisfeito do que no seu país. “Dacar é bom, mas você trabalha duro e eles não pagam bem. No Brasil, você pode pagar aluguel, eletricidade, água e ainda mandar dinheiro para a família.” Pode também comprar um notebook, do qual ele não desgrudou durante a conversa. Parte do dinheiro vai para a mãe e a irmã, na África. O pai vive há cinco anos na Itália, onde passa por dificuldades.

Ndongo nem pensa em retornar ao Senegal, a não ser para visitar a família. Mas pensa, isso sim, em largar o emprego para se dedicar ao futebol. “Preciso do trabalho para sobreviver, mas meu sonho é ser jogador profissional.”

O campo do Cruzeiro, onde o Clandestino enfrentou o Falcatrua, fica ao lado de uma estrada de chão. Há uma pequena arquibancada e, atrás dela, o olhar se perde em morros e araucárias. Naquele sábado, os únicos jogadores negros eram Ndongo e Amadou, o goleiro camaronês de mais de 1,90 metro. O meio-campista senegalês mostrou ter cacoetes de quem já jogou profissionalmente. Mas errou passes bobos e usou os braços acintosamente na marcação. Ndongo tem a cabeça raspada, com um filete de cabelo ligando a testa à nuca, e sorriu orgulhoso quando alguém o chamou de Balotelli.

Na arquibancada, metade dos quatro torcedores presentes avaliou que Ndongo não se destacara entre os jogadores do final de semana. Mas ele não parece disposto a desistir do sonho de jogar profissionalmente. Na volta para casa, quase toda a colônia senegalesa da cidade conversavaem torno de uma travessa servida no chão da garagem com carne, batata frita, azeitona, pimentão, cebola, maionese e ketchup. Cada um servia-se enfiando todos os ingredientes num pedaço de pão. Todos menos Ndongo, que mal chegou e já saiu para jogar futebol de salão.



http://revistapiaui.estadao.com.br/edicao-87/esquina/ndongo-quer-ser-titular
 
http://anivelde.org/sorryperiferia/2013/12/13/aquarela-brasileira.htm

Aquarela brasileira
POR FERNANDO VIVES


Fui de ônibus para o Rio de Janeiro. Embarquei mais tarde para evitar a hora do rush da manhã em São Paulo, mas peguei a hora do rush da tarde no Rio e lá se foram sete horas para chegar. Na rodoviária, constatei que roubaram minha mochila (com o notebook da empresa) que estava no compartimento acima do assento.

Delegacia. Policial descansava com uma espécie de metralhadora pendurada no ombro, que, mesmo supondo estar travada, amedrontava quem estava no recinto esperando para fazer um boletim de ocorrência. O escrivão deu uma risadinha quando ouviu meu problema, quase me chamando de trouxa. Reclamou que me mandaram para a DP errada, e que sempre fazem isso. Passou cinco minutos dando porrada na mesa e berrando que o sujeito que fez o novo software de boletim de ocorrência “nunca botou a bunda numa delegacia”. Na mesa ao fundo, outro escrivão dizia pra um sujeito que “a Lei Maria da Penha está aí pra foder os hómi, meu chapa”. Chegam policiais com bandidos algemados e os mantêm junto com os outros policiais e os que esperavam pro B. O. na sala.

Dia seguinte. Chuvas torrenciais alagam metade da cidade e praticamente inviabilizam por dias outras cidades pobres ao redor. O prefeito pede para ninguém sair de casa, porque está o caos. Na TV, a miséria humana do terceiro mundo. A mulher de 50 anos que viu o marido ser levado pela correnteza e morrer. A família que perdeu tudo pela segunda vez — a anterior tinha sido 15 dias antes. A família que saiu correndo da casa pelo buraco do ar condicionado segundos antes de ela desabar no barranco. O choro urrante da mulher que perdeu tudo, inclusive a casa, ser levada barranco abaixo. Desligo a TV, abro a janela e vejo todos os carros praticamente estacionados na rua, competindo pra ver quem buzina mais.

Na rua. Caminho pela calçada de um metro e meio de largura desviando dos postes molhados que colocaram bem no meio delas. Depois de dois banhos de poça d´água consecutivos, entendi que tem motorista que passa de propósito na poça só pra ensopar as pessoas, porque, na dimensão de mundo dele, é engraçado.

No táxi. Reclamo que o taxímetro está em bandeira 2, mas são 11 horas da manhã. O taxista responde que todo táxi no Rio tá com bandeira 2 o tempo inteiro por conta de questões burocráticas com a prefeitura, e então o “prefeito deixou”. Quando o 3G finalmente funciona, o que é raro, constato que é verdade.

Em outro táxi, acho um celular Samsung Galaxy no banco do passageiro e entrego ao motorista. Imediatamente me arrependo. Disse para me devolver, que eu o deixaria no hotel e o dono poderia buscar. O taxista diz que o passageiro anterior era amigo dele, que mora no centro, ele tinha acabado de deixar o cara — estávamos em Copabacana e eu vi ele deixando o passageiro anterior ali. Insisto pra ele devolver, que eu poderia cuidar disso, e ouço que é pra confiar nele. O celular toca, ele desliga o aparelho e joga no cesto ao lado da porta, para eu esquecer o assunto.

Tudo isso foi no Rio, mas poderia facilmente ter ocorrido em São Paulo, em Porto Alegre, em Jundiaí, em Maceió. O Brasil não é para amadores, mas eu não sei se quero ser assim tão profissional.



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Esboço da artista enquanto musa da Geração Y
por Daniel Pellizzari

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Sasha Grey em São Paulo em agosto de 2013 (por Renato Parada)

Fisicamente, ela é pequena. O corpo miúdo contrasta com os traços fortes do rosto, a cabeça parece um pouco maior do que deveria ser. Nascida Marina Ann Hantzis, ao completar 18 anos abandonou a faculdade na Califórnia, onde estudava cinema após completar o ensino médio um ano mais cedo. Em seguida adentrou a indústria pornô usando o nome Anna Karina, como homenagem à musa de Jean-Luc Godard, mas logo misturou KMFDM, Oscar Wilde e pequenas alterações de grafia para chegar ao pseudônimo sob o qual ganharia notoriedade: Sasha Grey.

Logo no primeiro filme a postura deliberadamente desafiadora e casca-grossa – “a degradação parecia ser incapaz de degradá-la”, como bem definiu Daniel Galera – chegou a intimidar Rocco Siffredi, veterano macho alfa do pornô. Rocco se consagrou nos anos 1990, década de Sylvia Saint e Jenna Jameson, pornstars com personalidade de boneca inflável. Verdade que nessa época também havia Asia Carrera, integrante da Mensa (associação internacional de indivíduos com alto QI). Mas era uma curiosidade biográfica e nada mais: apesar de inteligente e autoproclamada nerd, Carrera não transferia essas características pessoais para seu trabalho na indústria pornográfica.

“Quantas atrizes pornô são existencialistas?”, Sasha Grey perguntou retoricamente numa entrevista feita em algum ponto dos três anos de carreira como atriz (se parece pouco, cabe lembrar que foram 271 filmes). Ela entrou em cena em meio à ascensão no pornô de mulheres fortes e de postura mais assertiva, como Belladonna, uma influência confessa. Acabou se destacando pela combinação entre performances e persona: as referências intelectualizadas já bastariam para que chamasse a atenção em meio às colegas, mas Sasha tentava encarnar o próprio discurso, transformando suas atuações em intervenções performáticas e construindo aos poucos e em público uma persona artística bem delineada, uma (por mais que isso pareça estranho em se tratando de atrizes pornô) marca autoral. E nesse processo, ao mesmo tempo deixava transparecer uma honestidade quase perturbadora para quem estava prestando atenção.

Com essas características e esse histórico de interesses e inquietações, parece natural que Sasha Grey não tenha ficado satisfeita apenas com a pornografia, que abandonou de vez em 2011, e passado a atuar em filmes convencionais (estreando em The girlfriend experience, de Steven Soderbergh), além de participar da banda industrial aTelecine, lançar o livro de fotografia neü sex e agora, aos 25 anos, estrear na ficção em prosa com Juliette Society, lançado no Brasil pela Leya com tradução de Bruna Axt Portella.

[video=youtube;ZgB2Qx2n4i0]http://www.youtube.com/watch?v=ZgB2Qx2n4i0[/video]

Juliette Society é narrado por Catherine (uma referência a Belle de jour, de Buñuel), estudante de cinema em crise com o namorado que aos poucos é dominada por fantasias sexuais obsessivas e acaba se envolvendo com um grupo misterioso através da amizade com uma colega menos reprimida sexualmente. “De certo modo, Catherine é quem eu teria me tornado se tivesse tomado decisões diferentes na vida”, diz a autora. É uma personagem interessante, mas seu arco narrativo é previsível e, como o livro inteiro, não chega a empolgar como entretenimento. A desenvoltura na composição das cenas de sexo, notoriamente complicadas para qualquer escritor, é às vezes invejável, e algumas delas funcionam muito bem. Mas o melhor do livro é mesmo Bundy, personagem coadjuvante que é um belo espécime da categoria “canalhas carismáticos” da literatura.

Quando, sentado no chão do quarto do hotel, parabenizo Sasha por essa criação, ela, sentada na cama, abre um sorriso, inclina a cabeça um pouco para o lado e comenta, meio pensativa: “fico muito feliz que você tenha dito isso, sério mesmo”. Como um pouco antes ela havia mencionado planos para uma trilogia, parece que vem mais Bundy por aí – ou talvez tenha precisado negociar com o editor a manutenção no livro de um personagem que à primeira vista pareceria detestável para boa parte dos leitores de um livro feito para vender como água.

O lançamento de Juliette Society em São Paulo foi um sucesso, batendo o recorde de livros autografados na livraria: foram mais de quinhentos exemplares em quase cinco horas. Parte considerável do público estava na faixa dos vinte e bem poucos anos, com uma presença significativa de mulheres jovens e vários casais. Muitas das mulheres comentaram com Sasha que a têm como role model, um exemplo. “É estranho ser considerada um exemplo”, comenta. “Entrei na indústria pornô para resolver minha própria sexualidade. Mesmo assim, fico feliz que tenha inspirado outras jovens a também encararem de frente a própria sexualidade”.

É um indicativo de um processo de inserção da pornografia no mainstream, como parte indissociável da cultura de massa. A aura do pornô como algo proibido, vergonhoso e sujo, velha conhecida das gerações anteriores, deu lugar a adolescentes usando camisetas com a inscrição “pornstar” sem nenhum constrangimento e à estética pornô se tornando parte do cotidiano. Pornografia audiovisual de todo tipo – pornô convencional, fetiches de toda sorte, vídeos amadores gravados com celular – inundam a internet (aqui um sinônimo para: o mundo).

Hoje nenhum moleque precisa passar pelo constrangimento de alugar um filme pornô numa locadora – quase um rito de passagem da minha geração –, e, o que é ainda mais importante, as meninas têm a mesma oportunidade de acesso fácil e ubíquo (se o rito da locadora já era complicado para jovens do sexo masculino, é fácil imaginar o que representava para as adolescentes da mesma idade). No Tumblr, a verdadeira rede social dessa geração que não vê muito sentido na distinção entre público e privado em nenhuma área da vida (e, de certo modo, nem entre pornografia – como performance realizada para um observador externo – e sexo – como ato íntimo que só diz respeito aos envolvidos), imagens eróticas e pornográficas são onipresentes, e nenhum profissional (ou ex) aparece com mais frequência que Sasha Grey (James Deen, ator pornô ainda em atividade que se tornou uma espécie de galã das adolescentes, é o único a ameaçar seu posto).

E foi nessa sociedade pornificada que a literatura erótica também se tornou um fenômeno de massa, a partir das vendas acachapantes da série 50 tons, de E. L. James. Não que livros eróticos – de romances descartáveis vendidos em bancas a obras com qualidade literária – tenham sido inventados agora: é um gênero tão antigo quanto a própria ficção em prosa. Mas um sucesso nessas dimensões, atingindo uma demografia tão variada, chama a atenção. Por que a palavra escrita, e logo agora? Seria um movimento de busca pela narrativa, pela fantasia sexual com enredo, em meio ao excesso de oferta de imagens em movimento sem nenhuma coesão interna?

“Mais uma vez, é tudo culpa da internet”, diz Sasha Grey. Para ela, isso é parte do mesmo fenômeno que massificou a pornografia e a tornou mais aceitável no mainstream. “As pessoas estão perdendo a vergonha de assumir publicamente sua sexualidade, suas fantasias”. Faz sentido. 50 tons começou na internet, como fanfic (ficção amadora, escrita por fãs) erótica com personagens da série Crepúsculo. E assim como ainda há muito espaço para fantasias sobre um príncipe encantado (apesar de todo o BDSM, esta é a essência de 50 tons), existe mercado para tudo. Inclusive para Juliette Society, que vai na direção oposta.

Comento que, com o livro, agora Sasha ingressou num universo onde ter simpatias existencialistas não é exatamente um diferencial. Com isso em mente, o que então a tornaria única como autora? Ela devolve a única resposta possível: “minhas experiências”. Isso poderia ser dito de qualquer autor, em qualquer gênero, mas é correto: tudo que um autor tem para trabalhar são suas experiências, o diferencial é saber (ou não) o que fazer com isso através da intersecção entre técnica e talento. Pergunto se ela tem planos de escrever algum livro sem nenhuma relação direta com sexo. Na mesma hora percebo que isso soou mal, ainda que não tenha sido minha intenção.

Sasha ergue uma das sobrancelhas e muda de expressão. “Claro, já fiz muitas coisas sem nenhuma carga erótica, muitos roteiros, estou sempre trabalhando nisso”. Ouvindo isso, lembro do projeto de leituras para crianças em escolas, abortado por conta da reação indignada de pais e professores. Resolvo perguntar sobre algo que me interessa mais diretamente: em 2010, numa entrevista, ela comentou estar envolvida com um “filme black metal”. Quero saber que fim esse projeto levou, e de onde vem o interesse dela pela estética – aqui ela volta a sorrir – e pela ética – aqui, uma risada – do black metal.

Fico sabendo que o projeto ainda está vivo, ainda na fase de roteirização, mas empacado há algum tempo na dificuldade de se lidar com o tema sem resvalar na caricatura ou, pior ainda, na visão irônica. Sasha Grey respeita demais o black metal para isso. O que a fascina: entender a criação, através de uma estética bem demarcada e visualmente fascinante, com grande ênfase na natureza, de um ethos próprio que vai de encontro ao ethos vigente. A criação de um universo através do desenvolvimento de uma linguagem própria, com códigos nem sempre compreensíveis pela sociedade como um todo. O fato de ser um gênero-cultura isolado e resistente à comercialização. “Como o hip hop no início”, ela diz, e é a minha vez de sorrir.

A assessora avisa que o tempo terminou. Esqueci de conversar sobre o conceito de erotismo de Georges Bataille, que sempre me pareceu presente no discurso de Sasha Grey. Não deu tempo de perguntar sobre a provável influência da cosmovisão espermognóstica (talvez via Coil e Throbbing Gristle, nomes importantes – e seminais em mais de uma acepção – da música industrial) no interessante sexto capítulo do livro. Mas antes que eu fosse embora, ainda conversamos um pouco sobre David Tibet, músico/poeta/profeta gnóstico e único membro fixo da banda experimental inglesa Current 93, com quem ela gravou em 2009.

“É ótimo trabalhar com ele, que tem um olho incrível para descobrir novos talentos com algo de único”. Um deles é Antony Hegarty, ganhador em 2006 do Mercury, prêmio mais importante da indústria musical britânica. “Tivemos conversas intermináveis sobre todos os assuntos”, ela conta. “Ele não aprova as coisas que fiz, mas em momento algum fez eu me sentir um lixo. Era mais como um irmão mais velho preocupado com o meu bem-estar. David é uma pessoa realmente boa, sabe? Alguém genuinamente bom e aberto. Isso é uma coisa tão rara”. E é mesmo.

Durante a estadia no Brasil, Sasha Grey está lendo Gabriele d’Annunzio.


http://www.blogdoims.com.br/ims/esb...to-musa-da-geracao-y-–-por-daniel-pellizzari/
 
Euzinho

A modernidade é uma declaração de guerra à ideia de tradição.
Mas nós, modernos, continuamos a não perceber isso, e o resultado é que suspiramos como bobos diante do que pensamos ser uma tradição, apesar de detestarmos qualquer sinal verdadeiro de tradição.
Procuramos tradições em workshops xamânicos, espaços budistas nas Perdizes, livros baratos sobre como viviam os druidas.

São muitas as definições de tradição. Não vou dar mais uma, mas sim elencar atitudes que estão muito mais próximas do que é uma tradição do que cursos de cabala nos Jardins. Nada tenho contra estudar culturas antigas, apenas julgo um equívoco confundir a ideia de tradição com modas de uma espiritualidade de consumo.

Não existe xamã na Vila Madalena. A cabala não vai salvar meu casamento. Meditação não fará de mim uma pessoa melhor no trabalho. Imitar a alimentação de monges tibetanos não aliviará minha inveja. Frequentar cachoeiras indígenas não fará de mim uma pessoa menos consumista. Tatuar palavras védicas não me impedirá de fazer qualquer negócio pra viver mais.

Visitar templos no Vietnã não fará de mim alguém menos dependente das redes sociais.
Desejar isso fará de mim apenas ridículo.
Uma tradição, pra começo de conversa, nada tem a ver com "escolha". Não se escolhe uma tradição.
Neste sentido, muitos rabinos têm razão em desconfiar de conversos ao judaísmo por opção.

Uma tradição funciona sempre contra sua vontade, à revelia de sua consciência, submetendo-a ao imperativo que escapa à razão mais imediata.
A única forma de tradição a que a maioria de nós ainda tem acesso é a língua materna.

Colocar os filhos pra dormir todos os dias é mais próximo do que é uma tradição do que estudar velhos símbolos indígenas ou brincar com eles em pousadas nas chapadas. Não poder sair à noite porque um dos filhos tem febre é tradição. Velá-lo durante a noite é tradição. Morrer de medo durante esta noite é tradição.
Nada menos tradicional do que uma mulher sem filhos. Ela até pode aprender capoeira, mas será apenas iludida, se sua intenção for experimentar a tradição afro.

Nada tenho contra mulheres não terem filhos, digo apenas, de forma modesta, o que é uma tradição.
Homens que sustentam sua mulher e filhos são tradicionais, mesmo em tempos como os nossos em que todo mundo mente sobre isso. Levar seus velhos ao hospital, enterrá-los, em agonia ou com absoluta indiferença, é tradição.
Andar pela casa à noite pra ver se tem algum ladrão, enquanto sua mulher e filhos ficam protegidos no quarto, é tradição. Ser obrigado a ser corajoso é uma tradição, maldita, mas é.

Pular sete ondas numa Copacabana lotada nada tem de tradicional, é apenas chato. Tradição é ir pra guerra se não sua mulher achará você covarde. Lavar louça, fazer o jantar, lavar banheiros, morrer de medo diante do médico.Falar disso pra quem vive uma situação semelhante a você.
Ter que passar nas provas na escola. Ter que ser melhor do que os colegas. Sangrar todo mês.

Tradição é pagar contas, enfrentar finais de semana vazios e não desistir. É sonhar com um futuro que nunca chega. Engravidar a namorada. Ter ciúmes. Odiar Deus porque somos mortais. Ter inveja da amiga mais bonita, do amigo mais forte e inteligente. É cuidar dos netos. É educar os mais jovens e não deixar que eles acreditem nas bobagens que inventam.

Tradição funciona como hábitos que se impõem com a força de um vulcão, de um terremoto, de um tsunami, de uma febre amarela. Nada tem a ver com se pintar como aborígenes pra defender reservas indígenas ou abraçar árvores.
Evolução espiritual é um dos top em quem quer "adquirir" uma tradição.
Mas esta nada tem a ver com "buscar" uma evolução espiritual como forma de fugir de filhos que têm febre ou compromissos afetivos.

A evolução espiritual verdadeira é algo que nos acomete como uma disciplina aterrorizante.


Teste definitivo:

Você busca evolução espiritual pra aperfeiçoar seu "euzinho"? Lamento dizer que qualquer evolução espiritual (se existir) começa com você esquecer que seu euzinho existe.

 
A versão mais forte?
MARINA ROSSI São Paulo 25 JAN 2014 - 17:32 BRST

via http://brasil.elpais.com/brasil/2014/01/25/sociedad/1390678371_750307.html

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Em 1914, há exatos cem anos, o poeta e jornalista Emílio de Meneses, eleito para ser um dos 40 imortais, como são chamados os ocupantes de uma cadeira na Academia Brasileira de Letras (ABL), não pôde tomar posse. Seu discurso havia sido censurado, como contou o antropólogo Darcy Ribeiro (1922-1997) no livro Aos trancos e barrancos – como o Brasil deu no que deu. Escreveu Ribeiro: “O discurso ofendeu a casa”. Com um pedido da ABL para que Meneses fizesse algumas emendas em seu discurso, o poeta morreu, quatro anos mais tarde, sem tomar posse na Academia. O caso provavelmente não teria acontecido dessa maneira se Meneses tivesse, naquela época, um assessor de imprensa para ajudá-lo a tornar o seu discurso mais coerente com as normas da casa.

Embora as assessorias de imprensa tenham começado a surgir no Brasil somente na década de 1950, como conta Manuel Carlos Chaparro, doutor em Ciência da Comunicação, jornalista e professor da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo e um dos precursores da comunicação empresarial no país, foi junto com as assessorias que as informações passaram a ter uma espécie de filtro, capaz de ajudar as empresas e políticos, mas, ao mesmo tempo – e esse é o problema - bloquear o acesso público a algumas informações.

A tentativa de controlar a informação, embora negada pelas agências, é comum no dia a dia das redações. Enquanto esta matéria estava sendo produzida, a reportagem do EL PAÍS foi interrogada pela agência CDN, uma das gigantes do setor, sobre em qual editoria a reportagem seria publicada, em qual data, com quais outras pessoas a reportagem estava falando e até mesmo o nome da chefia de reportagem e – vejam só – “quem havia sugerido a pauta”. Esses são cuidados necessários ou trata-se de uma tentativa de intimidar o jornalista antes mesmo de a entrevista ser agendada?

“Fazemos isso para que possamos esclarecer o nosso cliente da melhor forma possível. Queremos entender o contexto da reportagem”, diz João Rodarte, presidente da CDN, que hoje emprega 400 pessoas e fatura 88 milhões de reais ao ano. Nesse caso, o cliente era ele mesmo, que concedeu uma entrevista por telefone ao EL PAÍS. Para Rodarte, a questão da isenção é muito clara para o jornalista, mas a coisa muda de cenário quando se trata de profissionais da assessoria de imprensa. “Aqui, nós trabalhamos para o cliente. Não somos isentos. Nosso papel é o de mostrar o nosso cliente e assegurar que ele tenha um posicionamento equilibrado e correto na imprensa”, diz. “O jornalista, quando está na redação, tem um código de ética. Mas quando ele vem para as agências, ele é um profissional da comunicação, não é um jornalista mais”.

Hoje, milhares de pessoas fazem esse trabalho de filtragem. Uma outra grande agência de relações públicas e assessoria de imprensa, a FSB, chega a empregar, sozinha, 650 funcionários e a faturar 145 milhões de reais. Para se ter uma ideia, o jornal O Estado de S. Paulo, fundado em 1875, tem 282 jornalistas, segundo o departamento de recursos humanos. A Folha de São Paulo, jornal de maior circulação no país, de acordo com a Associação Nacional de Jornais, emprega 400 pessoas, nas duas publicações do Grupo - Folha e Agora – como relatou Sérgio Dávila, editor-executivo da Folha.

Se a quantidade de assessores é muito maior que a de jornalistas, a informação corre então o risco de pender para o lado mais forte? “No mínimo, os assessores conseguem um espaço para colocar seus clientes e, no máximo, eles conseguem distorcer a informação”, diz o jornalista Mario Sergio Conti, ex-diretor de redação da revista Veja e atual colunista dos jornais Folha de São Paulo e O Globo. Conti escreveu também o livro Notícias do Planalto (Companhia das Letras), sobre os bastidores do impeachment do ex-presidente Fernando Collor. “Os assessores estão lá para colocar a versão do cliente, ou batalhar para que não seja publicada a versão de uma história que ele não queira, e até mesmo para bloquear algo que ele não queira que seja publicado”, diz.

Tanto quanto filtrar a informação, o que as assessorias fazem é oferecer suas notícias insistentemente para os jornalistas. Diariamente, centenas de sugestões de reportagens chegam às redações. “Isso compromete a notícia, porque ela deixa de ser uma busca do veículo de imprensa, para ser uma necessidade de uma fonte de vender os seus interesses”, afirma o jornalista Alberto Dines, que em seus mais de sessenta anos de carreira, lançou diversas revistas e jornais no Brasil e em Portugal e hoje dirige o site de crítica da mídia O Observatório da Imprensa. Para Chaparro, da USP, a situação pode ser olhada de outra maneira: “Existe uma crise, porque a notícia não nasce mais de dentro das redações. Mas, será que é melhor um mundo onde só os jornalistas possam falar, invés de um lugar em que todos falem?”.

Se, por um lado, as agências têm muita abrangência, por outro, muitas redações parecem acomodadas com a situação, segundo Conti. “Claro que existe preguiça por parte dos jornalistas da redação”, afirma. Um caso que ilustra a fragilidade das redações diante das sugestões que vêm de fora, ocorreu no Brasil em 2006, quando o consultor de RH Ary Itnem surgiu na Avenida Paulista com um cartaz pedindo “um abraço”. Sua “teoria do abraço” dizia que era possível combater o mal estar corporativo com abraços, uma ideia desenvolvida pela “Confraria Britânica do Abraço Corporativo”. Itnem virou notícia em diversos veículos. Foi entrevistado por jornalistas renomados como Heródoto Barbeiro, na rádio CBN, e Gilberto Dimenstein, na Folha de S. Paulo.

Revelou-se, depois, que Ary Itnem nunca existiu. A grafia de seu nome (a palavra "mentira" ao contrário), seu personagem e sua teoria, foram inventados pelo jornalista Ricardo Kauffman, que transformou a história no documentário “O abraço corporativo” (2010). Ele mostra como poucas pessoas e pouco tempo para apuração em uma redação deixam qualquer veículo de imprensa suscetível a erros que podem ser graves, como o de publicar como verdadeira uma história que não existe. “A quantidade absurda de assessores em relação aos repórteres, o fato de os jornalistas saírem das redações em busca de salários melhores, isso tudo enfraquece o jornalismo”, diz Chaparro.

As previsões sobre o futuro sugerem que a demografia dessa relação deve continuar favorável às assessorias no embate com as redações. De acordo com o Ministério do Trabalho, existem hoje cerca de 145 mil jornalistas registrados. Um levantamento feito por um núcleo de pesquisa da Universidade de Santa Catarina (UFSC) em parceria com aFederação Nacional dos Jornalistas (FENAJ), mostra que, a cada dez jornalistas, um é professor, quatro trabalham fora da imprensa e cinco ainda estão empregados na mídia. Mas o professor Samuel Lima, um dos responsáveis pelo estudo, afirma que esses dados estão mudando. “Há uma tendência de que, na nossa próxima pesquisa, que sai em 2017, encontremos mais profissionais atuando fora da mídia”.

Para Dines, essa balança desequilibrada desfavorece a sociedade. “A sociedade é quem mais perde, porque a imprensa não está enriquecendo o debate”, diz. Conti, por sua vez, acha que as assessorias vão continuar crescendo: “Hoje você não consegue falar com um cantor, por exemplo, sem antes ter que falar com meia dúzia de gente. Isso é um absurdo. Antes, a única coisa que você tinha que fazer, era ligar para as secretárias das fontes. Eu costumava ficar amigo das secretárias. Hoje não adianta mais”. Ainda que as perspectivas não sejam as melhores, ele é otimista. “Os dinossauros foram extintos, mas as baratas sobreviveram. Eu espero que o jornalista seja uma barata”.


via http://brasil.elpais.com/brasil/2014/01/25/sociedad/1390678371_750307.html
 
Flatulência de vacas provoca explosão na Alemanha
Um animal ficou ferido e teto de celeiro ficou danificado

BBCBrasil.com

O gás metano expelido por vacas provocou uma explosão em um celeiro na Alemanha na segunda-feira. A explosão feriu um dos animais e danificou o teto do celeiro no vilarejo de Rasdorf, na região central do país.

O gás acumulou-se com a flatulência e arrotos expelidos por cerca de 90 vacas, que se acumulou no local. A polícia disse à agência de notícias Reuters que um foco de "energia elétrica estática provocou a explosão do gás".

Os serviços de emergência que visitaram à fazenda realizaram medições de gás metano no local.

Cada vaca é capaz de emitir 500 litros de gás metano por dia. O impacto ambiental da pecuária é alto, já que o metano é nocivo ao meio ambiente.

As vacas também expelem amônia, que pode danificar solo e água, devido ao nível tóxico de acidificação.
__________________________________________________________________________________________
É com grande preocupação que leio isto.
Não pelos efeitos nefastos na [R]cama do Osório[/R] camada de ozônio, mas sim pelo perigoso uso em atentados terroristas.
Imaginem a Al Kaeda alimentando com ovos, repolho e feijoada 10 inocentes vacas e soltam elas em uma praça de uma nação imperialista judaico cristã com um pavio de tempo rosqueado no c. delas. As chamadas vacas-bomba.
Imaginem o estrago que faria.
Homem-bomba pareceria bombinha de 1 reau perto delas.
Chupa 11 de setembro!

http://noticias.terra.com.br/ciencia/flatulencia-de-vacas-provoca-explosao-na-alemanha,9ad51543448d3410VgnVCM10000098cceb0aRCRD.html
 
http://www.manualdeingenuidades.com.br/2013/12/09/o-perfeito-idiota-de-classe-media-brasileiro


O perfeito idiota de classe média brasileiro
Por Adriano Silva

Ele não faz trabalhos domésticos. Não tem gosto nem respeito por trabalhos manuais. Se puder, atrapalha o trabalho de quem pega no pesado. Aprendi isso em criança: só enfia o pé na lama com gosto quem nunca teve o desgosto de ir para o tanque na área de serviço, depois, esfregar o tênis ou a chuteira debaixo de água fria. Só deixa um resto de bebida secar no fundo de um copo quem nunca teve que fazer o malabarismo de meter a mão lá dentro com uma esponja, com a barriga encostada na pia, para tentar lavá-lo.

Trata-se de uma tradição lusitana, ibérica, que vem sendo reproduzida aqui na colônia desde os tempos em que os negros carregavam em barris, nas costas, a toilete dos seus proprietários, e eram chamados de “tigres” – porque os excrementos lhes caíam sobre as costas, formando listras que lembravam a pelagem do animal. O perfeito idiota de classe média brasileiro, ou PICMB, não ajuda em casa também por influência da mamãe, que nunca deixou que ele participasse das tarefas – nem mesmo por ou tirar uma mesa, nem mesmo arrumar a própria cama. Ele atira suas coisas pela casa, no chão, em qualquer lugar, e as deixa lá, pelo caminho. Não é com ele. Ele foi criado irresponsável e inconsequente. É o tipo de cara que pede um copo d’água deitado no sofá. E não faz nenhuma questão de mudar. O PICMB é um especialista em não fazer, em fazer de conta, em empurrar com a barriga, em se fazer de morto. Ele sabe que alguém fará por ele. Então ele se desenvolveu um sujeito preguiçoso. Folgado. Que se escora nos outros, não reconhece obrigações e que adora levar vantagem. Esse é o seu esporte predileto – transformar quem o cerca em seus otários particulares.

O tempo do perfeito idiota de classe média brasileiro vale mais que o das demais pessoas. É a mãe que fura a fila de carros no colégio dos filhos. É a moça que estaciona em vaga para deficientes ou para idosos no shopping. É o casal que atrasa uma hora num jantar com os amigos. A lei e as regras só valem para os outros. O PICMB não aceita restrições. Para ele, só privilégios e prerrogativas. Um direito divino – porque ele é melhor que todos os outros. É um adepto do vale tudo social, do cada um por si e do seja o que deus quiser. Ele só tem olhos para o próprio umbigo e os únicos interesses válidos são os seus.

O PICMB é o parâmetro de tudo. Quanto mais alguém for diferente dele, mais errado esse alguém estará. Ele tem preconceito contra pretos, pardos, pobres, nordestinos, baixos, gordos, gente do interior, gente que mora longe. E ele é sexista para caramba. Mesma lógica: quem não é da sua tribo, do seu quintal, é torto. E às vezes até quem é da tribo entra na moenda dos seus pré-julgamentos e da sua maledicência. A discriminação também é um jeito de você se tornar externo, e oposto, a um padrão que reconhece em si mas de que não gosta. É quando o narigudo se insurge contra narizes grandes. O PICMB adora isso.

O perfeito idiota de classe média brasileiro vai para Orlando sempre que pode. Seu templo, seu centro de peregrinação, é um outlet na Flórida. Acha a Europa chata. E a Ásia, um planeta esquisito com gente estranha e amarela que não lhe interessa. Há um tempo, o PICMB descobriu Nova York – para onde vai exclusivamente para comprar. Ficou meia hora dentro do Metropolitan, uma vez, mas achou aquilo aborrecido demais. Come pizza no Sbarro. Joga lixo no chão. Só anda de táxi – metrô, com a galera, nem em Manhattan. Nos anos 90, comprava camiseta no Hard Rock Cafe. Hoje virou um sacoleiro em lojas com Abercrombie & Fitch e Tommy Hillfiger. Depois de toda a farra, ainda troca cotoveladas no free shop para comprar uísque, perfume, chocolate e maquiagem. O PICMB é, sobretudo, um cara cafona. Usa roupas de polo sem saber o lado por onde se monta num cavalo. Nem sabe que aquelas roupas são de polo. Ou que polo é um esporte.

O PICMB adora pagar caro. Faz questão. Não apenas porque, para ele, caro é sinônimo de bom. Mas, principalmente, porque caro é sinônimo de “cheguei lá” e “eu posso” e “veja o quanto eu paguei nesse relógio ou nessa calça da Diesel”. Ele exibe marcas como penduricalhos numa árvore de natal. É assim que se mostra para os outros. Se pudesse, deixaria as etiquetas presas aos itens do vestuário e aos acessórios que carrega. O PICMB é jeca. É brega. Compra para se afirmar, para compensar o vazio e as frustrações, para se expressar de algum modo. O perfeito idiota de classe média brasileiro não se sente idiota pagando 4 000 reais por um console de vídeo game que custa 400 dólares lá fora. Nem acha um acinte pagar 100 000 reais por um carro que vale 25 000 dólares. Essa é a sua religião. Ele não se importa de ficar no vermelho – a preocupação com ter as contas em dias é para os fracos. Ele é o protótipo do novo rico burro. Do sujeito que acha que o bolso cheio pode compensar uma cabeça vazia.

O PICMB é cleptomaníaco. Sua obsessão por ter, e sua mania de locupletação material, lhe fazem roubar roupão de hotel e garrafinha de bebida do avião e amostra grátis de perfume em loja de departamento. Ele pega qualquer amostra de produto que esteja sendo ofertada numa degustação no supermercado. Mesmo que não goste daquilo. O PICMB adora boca livre e hotéis “all inclusive”. Ele adora camarote – quando ele consegue sentir o sangue azul fluindo em suas veias. Ele é a tradução perfeito do que é um pequeno burguês.

O perfeito idiota de classe média brasileiro entende Annita. Vibra com Latino. Seu mundo cabe dentro do imaginário do sertanejo romântico. Ele adora shows megaproduzidos, com pirotecnia, luzes e muita coreografia, cujos ingressos custem mais de 500 reais – mesmo que ele não conheça o artista. Ele não se importa de pagar uma taxa de conveniência escorchante para comprar esse ingresso da maneira mais barata para quem lhe vendeu – pela internet.

E o PICMB detesta ler. Comprou “50 Tons” para a mulher. E um livro de autoajuda para si mesmo. Mas agora que a novela está boa ficou difícil achar tempo para ler.


http://www.manualdeingenuidades.com.br/2013/12/09/o-perfeito-idiota-de-classe-media-brasileiro
 
Treinador de homens-bomba explode turma por engano
Homem dava aula para aspirantes a ataques suicida quando detonou explosivos presos ao corpo matando 22 e ferindo 15
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Foto: REUTERS
Militantes sunitas mascarados posam em foto na cidade de Faluja, A 70 quilômetros de Bagdá

BAGDÁ - Um grupo de extremistas sunitas que assistiam a uma aula de treinamento para atentados suicidas em um acampamento ao norte de Bagdá foi morto na segunda-feira quando seu comandante involuntariamente realizou uma demonstração com um cinto que estava cheio de explosivos, contaram funcionários do Exército e da polícia iraquiana.
Os combatentes pertenciam a um grupo conhecido como o Estado Islâmico do Iraque e da Síria, ou Isis, que luta na província de Anbar contra o Exército iraquiano, dominado por xiitas. Mas eles também estão ligados a ataques a bomba em outros lugares.
Vinte e dois membros do Isis foram mortos e 15 ficaram feridos na explosão no acampamento, que está em uma área de plantações no nordeste da cidade de Samarra, afirmaram as autoridades policiais e do Exército. Armazéns de explosivos e armas pesadas também ficavam nesse acampamento, segundo os funcionários. Oito militantes foram presos quando tentavam fugir.
O homem que estava conduzindo o treinamento não foi identificado pelo nome, mas foi descrito por um oficial do Exército iraquiano como um recrutador prolífico, que foi “capaz de matar os bandidos de uma vez”.
No início deste mês, militantes do Isis invadiram a cidade de Fallujah e a vizinha Ramadi, ambas na província de Anbar, com armamento pesado, assumindo o controle de vias de acesso e escritórios de autoridades locais.
Desde então, forças de segurança locais e tribais reestabeleceram o controle em Ramadi.
Mas o Iraque está desenvolvendo um plano, com a ajuda dos Estados Unidos, que faria tribos sunitas assumirem a liderança na luta contra o Isis em Fallujah com apoio do Exército iraquiano, um alto funcionário do Departamento de Estado disse ao Congresso na semana passada.
A fonte, o funcionário Brett McGurk, afirmou que o Isis tinha cerca de dois mil combatentes no Iraque, e que seu objetivo a longo prazo era estabelecer uma base de operações em Bagdá, liderada por Abu Bakr al-Baghdadi, que foi classificado como terrorista global pelo Departamento de Estado.


Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/mundo/trein...plode-turma-por-engano-11561425#ixzz2sxU95yaf
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Tô nem aí pros babacões que morreram.
Tô preocupado com a questão trabalhista e outros.
O fato será considerado "acidente de trabalho"?:hmm:
Agora que estão desempregados, como farão pra receber o seguro desemprego?:hmm:
As viúvas receberão "pensão por morte"?:hmm:
Os que sobraram receberão aposentadoria por invalidez?:hmm:
O fato de as bombas terem explodido pode ser considerado como um treinamento bem sucedido?:hmm:
Se as bombas não explodissem, e eles falhassem no atentado, eles morreriam de desgosto?:hmm:
Perguntas, perguntas e mais perguntas...
 
Produçãozinha VERA FISCHER - É VELHA MAS É BOA:


via http://blog.daniduc.net/2009/09/14/...e-poder-abrir-sem-medo-um-mac-book-no-onibus/


Da relação direta entre ter de limpar seu banheiro você mesmo e poder abrir sem medo um Mac Book no ônibus
por Daniel Duclos




A sociedade holandesa tem dois pilares muito claros: liberdade de expressão e igualdade. Claro, quando a teoria entra em prática, vários problemas acontecem, e há censura, e há desigualdade, em alguma medida, mas esses ideais servem como norte na bússola social holandesa.

Um porteiro aqui na Holanda não se acha inferior a um gerente. Um instalador de cortinas tem tanto valor quanto um professor doutor. Todos trabalham, levam suas vidas, e uma profissão é tão digna quanto outra. Fora do expediente, nada impede de sentarem-se todos no mesmo bar e tomarem suas Heinekens juntos. Ninguém olha pra baixo e ninguém olha por cima. A profissão não define o valor da pessoa – trabalho honesto e duro é trabalho honesto e duro, seja cavando fossas na rua, seja digitando numa planilha em um escritório com ar condicionado. Um precisa do outro e todos dependem de todos. Claro que profissões mais especializadas pagam mais. A questão não é essa. A questão é “você ganhar mais porque tem uma profissão especializada não te torna melhor que ninguém”.

Profissões especializadas pagam mais, mas não muito mais. Igualdade social significa menor distância social: todos se encontram no meio. Não há muito baixo, mas também não há muito alto. Um lixeiro não ganha muito menos do que um analista de sistemas. O salário mínimo é de 1300 euros/mês. Um bom salário de profissão especializada, é uns 3500, 4000 euros/mês. E ganhar mais do que alguém não torna o alguém teu subalterno: o porteiro não toma ordens de você só porque você é gerente de RH. Aliás, ordens são muito mal vistas. Chegar dando ordens abreviará seu comando. Todos ali estão em um time, do qual você faz parte tanto quanto os outros (mesmo que seu trabalho dentro do time seja de tomar decisões).

Esses conceitos são basicamente inversos aos conceitos da sociedade brasileira, fundada na profunda desigualdade. Entre brasileiros que aqui vêm para trabalhar e morar é comum – há exceções - estranharem serem olhados no nível dos olhos por todos – chefe não te olha de cima, o garçom não te olha de baixo. Quando dão ordens ou ignoram socialmente quem tem profissão menos especializadas do que a sua, ficam confusos ao encontrar de volta hostilidade em vez de subserviência. Ficam ainda mais confusos quando o chefe não dá ordens – o que fazer, agora?

Os salários pagos para profissão especializada no Brasil conseguem tranquilamente contratar ao menos uma faxineira diarista, quando não uma empregada full time. Os salários pagos à mesma profissão aqui não são suficientes pra esse luxo, e é preciso limpar o banheiro sem ajuda – e mesmo que pague (bem mais do que pagaria no Brasil) a um ajudante, ele não ficará o dia todo a te seguir limpando cada poerinha sua, servindo cafézinho. Eles vêm, dão uma ajeitada e vão-se a cuidar de suas vidas fora do trabalho, tanto quanto você. De repente, a ficha do que realmente significa igualdade cai: todos se encontram no meio, e pra quem estava no Brasil na parte de cima, encontrar-se no meio quer dizer descer de um pedestal que julgavam direito inquestionável (seja porque “estudaram mais” ou “meu pai trabalhou duro e saiu do nada” ou qualquer outra justificativa pra desigualdade).

Porém, a igualdade social holandesa tem um outro efeito que é muito atraente pra quem vem da sociedade profundamente desigual do Brasil: a relativa segurança. É inquestionável que a sociedade holandesa é menos violenta do que a brasileira. Claro que aqui há violência – pessoas são assassinadas, há roubos. Estou fazendo uma comparação, e menos violenta não quer dizer “não violenta”.

O curioso é que aqueles brasileiros que queixam-se amargamente de limpar o próprio banheiro, elogiam incansavelmente a possibilidade de andar à noite sem medo pelas ruas, sem enxergar a relação entre as duas coisas. Violência social não é fruto de pobreza. Violência social é fruto de desigualdade social. A sociedade holandesa é relativamente pacífica não porque é rica, não porque é “primeiro mundo”, não porque os holandeses tenham alguma superioridade moral, cultural ou genética sobre os brasileiros, mas porque a sociedade deles tem pouca desigualdade. Há uma relação direta entre a classe média holandesa limpar seu próprio banheiro e poder abrir um Mac Book de 1400 euros no ônibus sem medo.

Eu, pessoalmente, acho excelente os dois efeitos. Primeiro porque acredito firmemente que a profissão de alguém não têm qualquer relação com o valor pessoal. O fato de ter “estudado mais”, ter doutorado, ou gerenciar uma equipe não te torna pessoalmente melhor que ninguém, sinto muito. Não enxergo a superioridade moral de um trabalho honesto sobre outro, não importa qual seja. Por trabalho honesto não quero dizer “dentro da lei” - não considero honesto matar, roubar, espalhar veneno, explorar ingenuidade alheia, espalhar ódio e mentira, não me importa se seja legalizado ou não. O quanto você estudou pode te dar direito a um salário maior – mas não te torna superior a quem não tenha estudado (por opção, ou por falta dela). Quem seu pai é ou foi não quer dizer nada sobre quem você é. E nada, meu amigo, nada te dá o direito de ser cuzão. Um doutor que é arrogante e desonesto tem menos valor do que qualquer garçom que trata direito as pessoas e não trapaceia ninguém. Profissão não tem relação com valor pessoal.

Não gosto mais do que qualquer um de limpar banheiro. Ninguém gosta – nem as faxineiras no Brasil, obviamente. Também não gosto de ir ao médico fazer exames. Mas é parte da vida, e um preço que pago pela saúde. Limpar o banheiro é um preço a pagar pela saúde social. E um preço que acho bastante barato, na verdade.

PS. Ultimamente vem surgindo na sociedade holandesa um certo tipo particular de desigualdade, e esse crescimento de desigualdade tem sido acompanhado, previsivelmente, de um aumento respectivo e equivalente de violência social. A questão dos imigrantes islâmicos e seus descendentes é complexa, e ainda estou estudando sobre o assunto.

UPDATE: Muita gente tem lido este post como uma idealização da Holanda como um lugar paradisíaco. Nada mais longe da verdade. A Holanda não é nenhum paraíso e tem diversos problemas, muitos dos quais eu sinto na pele diariamente. O que pretendo fazer aqui é dizer duas coisas: a origem da violência no Brasil é a desigualdade social e 2, apesar da violência que gera, muita gente gosta dessa desigualdade e fica infeliz quando ela diminui, porque dela se beneficia e não enxerga a ligação desigualdade-violência. Por fim: esse post não é sobre a Holanda. A Holanda estar aqui é casual. Esse post é sobre o Brasil, minha pátria mãe.


Novamente, via http://blog.daniduc.net/2009/09/14/...e-poder-abrir-sem-medo-um-mac-book-no-onibus/
 
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Argumentos e contra-argumentos

Está no programa de redação da Fuvest: "A redação deverá ser, obrigatoriamente, uma dissertação, na qual se espera que o candidato demonstre capacidade de mobilizar conhecimentos e opiniões, argumentar coerentemente e expressar-se de modo claro, correto e adequado". É óbvio que não é só no vestibular que se deve "argumentar coerentemente"; isso é necessário em qualquer manifestação de pensamento.

Como se sabe, dissertar é defender uma tese. Por incrível que pareça, ainda há colegas que dizem aos seus alunos que eles não devem "dar opinião" ou que devem assumir posição neutra, o que implica "mostrar um ponto a favor e outro contra". E concluir pelo "muro". Ai, ai, ai...

Tomemos como exemplo o tema do ano passado, baseado numa peça publicitária de um cartão de crédito ("Aproveite o melhor que o mundo tem a oferecer com o cartão de crédito X"). Assim terminava o enunciado: "Procure argumentar de modo a deixar claro seu ponto de vista sobre o assunto". Viu que é preciso, sim, apresentar um ponto de vista, isto é, defender uma posição?

"E se o examinador tiver uma posição diferente da minha?" Nenhum problema, desde que ele não seja um doido varrido. Examinador decente não julga o ponto de vista do candidato; julga como o candidato apresenta esse ponto de vista. É aí que entra o item "argumentar coerentemente", o que, em outras palavras, significa que os argumentos precisam sustentar-se, ter nexo e ser imunes a contra-argumentos.

Quer um bom exemplo? A recente tentativa do ministro da Fazenda de adiar a obrigatoriedade do airbag e do ABS nos carros nacionais. O argumento do ministro (e dos supermodernos sindicalistas)? Com o fim da produção dos automóveis nos quais a introdução dos equipamentos de segurança seria tecnologicamente inexequível ou economicamente inviável, X funcionários perderiam o emprego. Deus do céu!!!

Como bem me disse o jornalista Luís Perez, especialista em automóveis, "quando aventaram a possibilidade de prorrogar o prazo, senti vergonha alheia". Também senti.

O ministro e os sindicalistas não sabem que a manutenção desses (poucos) empregos não justificaria os altos gastos do Estado com os tratamentos e as pensões resultantes dos acidentes, ferimentos e mortes que seriam evitados com o ABS e o airbag? Esse pessoal não sabe fazer contas? É também insensível e incapaz de relacionar lé com lé e cré com cré? A genial posição do ministro e dos sindicalistas constitui um forte exemplo de argumento incoerente, insustentável. Zero para eles!

Não é à toa que muita gente vai mal não só na redação, mas também nas questões de compreensão de texto. Quem pensa mal lê mal e escreve mal. Pensar não dói, caro leitor. Vamos lá! Coragem! E, se quiser um bom treino, fuja dos "debates" nas "redes sociais". A bobajada é de doer. Os argumentos são de uma incoerência assustadora! É isso.


http://www1.folha.uol.com.br/colunas/pasquale/2014/01/1392204-argumentos-e-contra-argumentos.shtml

Pasquale Cipro Neto é professor de português desde 1975.
 
A carta que Martin Scorsese escreveu para sua filha

O semanário italiano L’Espresso publicou uma carta aberta de Martin Scorsese destinada a sua filha, Francesca de 14 anos (sua filha mais nova).

A carta segue abaixo e pode interessar, além envolvidos com cinema e fãs do diretor, a todos nós, na medida em que a situação relatada por ele pode ser aplicada a outras formas de arte.

Nunca foi tão fácil e barato para um músico compor suas músicas, gravá-las e divulgá-las na internet.
Da mesma forma, nunca foi tão fácil para um escritor pular todos os custos de publicação e distribuição editorial, divulgando seus contos e romances também na internet. Mas até que ponto essas facilidades podem deixar os artistas mais descomprometidos e descuidados? Se podemos dar tantos tiros quanto quisermos, porque a arma é barata e a munição farta, teremos a mesma dedicação e esforço em aprimorar nossa mira que teríamos se apenas uma bala estivesse a nossa disposição?

Quando são poucas e preciosas as oportunidades, não colocamos todo nosso espírito e inspiração nas raríssimas chances que surgem?

O cenário descortinado por Scorsese não é pessimista, mas promissor (diferente de seus amigos Steven Spielberg e George Lucas). Porém, ele não deixa de lembrar que novas oportunidades trazem novos problemas, e que mesmo os novos problemas podem ser enfrentados se consultarmos o legado de sabedoria deixado por velhos mestres.

Abaixo está a carta na íntegra.


"Querida Francesca,


Estou escrevendo esta carta para falar sobre o futuro. E estou olhando para ele através da lente de meu mundo.
Através da lente do cinema, que tem estado no centro de meu mundo.

Nos últimos anos, percebi que a ideia de cinema com a qual cresci, a ideia que está por trás dos filmes que te mostrei desde quando você era criança, e que prosperava quando comecei a filmar, está chegando ao fim. Não estou me referindo aos filmes que já foram feitos. Estou me referindo aos que estão por vir.


Não quero soar desesperado. Não estou escrevendo estas palavras com espírito de derrota. Ao contrário, acho que o futuro é brilhante.

Nós sempre soubemos que fazer filmes era um negócio, e que a arte do cinema foi possível porque ela se alinhava com as condições do mundo dos negócios. Nenhum de nós que começou nos anos 60 e 70 tinha qualquer ilusão a esse respeito. Sabíamos que teríamos que trabalhar duro para proteger aquilo que amávamos. Também sabíamos que poderíamos ter de passar por alguns períodos difíceis. E suponho que nós percebemos, em certo grau, que poderíamos chegar ao momento em que todos os elementos inconvenientes ou imprevisíveis na produção de um filme seriam minimizados, talvez até eliminados.


E qual elemento mais imprevisível de todos?

O próprio cinema.

E as pessoas que trabalham nele.

Não quero repetir o que já foi dito e escrito por tantos outros antes de mim, sobre todas as mudanças nesse negócio, e estou animado com as exceções à tendência geral no cinema – Wes Anderson, Richard Linklater, David Fincher, Alexander Payne, os irmãos Coen, James Gray e Paul Thomas Anderson estão conseguindo fazer seus filmes, e Paul não apenas conseguiu fazer The Master em 70 milímetros como também conseguiu que o filme fosse exibido nesse formato em algumas cidades.

Qualquer pessoa que se preocupa com o cinema deveria ser grato por isso.

E eu também me sinto entusiasmado com artistas que continuam a conseguir produzir seus filmes pelo mundo todo, na França, na Coréia do Sul, na Inglaterra, no Japão, na África. Está ficando mais difícil a cada momento, mas eles estão conseguindo realizar seus projetos.

Mas não acho que sou pessimista quando digo que a arte do cinema e da indústria do cinema está agora em uma encruzilhada.
O entretenimento audiovisual e aquilo que conhecemos como cinema — obras cinematográficas concebidas por indivíduos — parecem estar indo para direções distintas.

No futuro, você provavelmente verá cada vez menos o que reconhecemos como filmes sendo exibidos em cinemas multiplex e verá cada vez mais obras exibidas em salas menores, disponibilizadas online e, suponho, em lugares e circunstâncias que não sou capaz de prever.

Então, porque o futuro é tão brilhante? Porque pela primeira vez na história dessa forma de arte, os filmes podem ser feitos com muito pouco dinheiro. Isso não existia quando eu era um adolescente, e filmes de orçamento extremamente baixo sempre foram a exceção, e não a regra.

Agora, é o contrário.

Você pode obter belas imagens com câmeras acessíveis. Você pode gravar o som. Você pode editar, mixar e reajustar cores em casa. Tudo isso está acontecendo.

Mas com toda a atenção dispensada ao processo de fazer filmes e aos avanços tecnológicos que nos levaram a essa revolução na produção cinematrográfica, há uma coisa importante a lembrar: as ferramentas não fazem o filme, é você quem o faz. Você pode facilmente pegar uma câmera e começar a capturar imagens e então colocá-las todas juntas em uma edição final. Mas fazer um filme (aquele que você precisa fazer), é mais do que isso.

E não há atalhos.

Se John Cassavetes, meu amigo e mentor, estivesse vivo hoje, ele certamente estaria usando todo o equipamento que está disponível por aí. Mas ele diria as mesmas coisas que sempre disse — você tem que ser absolutamente dedicado ao trabalho, você tem que dar tudo de si mesmo, e você tem que proteger a centelha da conexão que levou você a fazer o filme, em primeiro lugar.

Você deve protegê-lo com sua vida.

No passado, porque fazer filmes era tão caro, tivemos que proteger contra a exaustão e os comprometimentos. No futuro, você terá de proteger-se contra outra coisa: a tentação de se deixar levar pela corrente e permitir que o filme fique a deriva, distanciando-se de você.

Esta não é apenas uma questão de cinema. Não existem atalhos para nada. Não estou dizendo que tudo tem que ser difícil. Estou dizendo que a voz que inflama você é a sua voz – a sua luz interior, como os Quakers costumam dizer.

Isso é você. Essa é a verdade.


Com todo meu amor,

Papai."
 
via http://www.brasilpost.com.br/gabriel-brust/novela-sintoma-de-uma-sociedade-que-nao-le_b_4760245.html
Novela: sintoma de uma sociedade que não lê
por Gabriel Brust



Não é preciso ser nenhum gênio para observar que há uma espécie de histeria coletiva sobre o Brasil em épocas de desfecho de novelas. Mas talvez seja preciso estar fora do Brasil para se conseguir ver o fenômeno com o distanciamento necessário para lamentá-lo. É provavelmente por isso que, nas conversas que mantive ao longo da semana com colegas jornalistas que estão no Brasil, o assunto foi "será que vai ter beijo gay no último episódio?" -- enquanto nas conversas que tive com jornalistas também brasileiros, mas que vivem por aqui, o debate foi: "por que raios as novelas ainda ocupam esse papel na vida do brasileiro?".

Há duas semanas, Avenida Brasil estreou na França, no canal France Ô. Estive no evento de lançamento organizado para a imprensa, em uma casa noturna de temática brasileira em Paris. Antes da projeção do primeiro capítulo, diante do público misto de brasileiros e franceses, um dos diretores da France Ô fez um curto discurso dizendo o quanto a emissora estava feliz de veicular este fenômeno de audiência no Brasil, "que ficou famoso por fazer até a presidente da república mudar os seus horários para assistir".

O discurso aumentou a expectativa dos brasileiros que ainda não haviam assistido a Avenida Brasil -- e mais ainda a dos gringos que, em grande parte, jamais haviam assistido a uma novela brasileira. As luzes são apagadas, param de circular as caipirinhas e as coxinhas de galinha, o "play" é acionado em três telões simultâneos. Com apenas cinco minutos de novela -- após a primeiríssima cena, em que Adriana Esteves tem um ataque histérico "à la Maria do Bairro" diante de uma criança, e Toni Ramos entra na sala para acalmá-la com sua pinta de galã de fim de linha -- já fica claro que não há nada ali. Ou, pelo menos, nada além do que uma novela mexicana filmada com uma câmera boa e bem editada. "Foi esse o fenômeno que fez a presidente do Brasil parar para assistir?". Pois é, foi isso.

Programas de televisão ruins existem no mundo todo -- Avenida Brasil vai ao ar diariamente na França, e a versão local do BBB volta e meia dá as caras. Há também algumas poucas novelas locais. A diferença é o alcance da televisão ruim: ela é feita para passar de tarde, longe do horário nobre e você muito raramente vai ouvir alguém comentar o que aconteceu no episódio de ontem. Muito menos se você frequentar uma universidade ou viver em um meio de gente que estudou minimamente. O alvo destes programas é claro: uma população de baixa renda e pouca instrução. E a repercussão no cotidiano é zero.

Claro que o Brasil tem uma população de poucas renda e instrução proporcionalmente maior do que em outros países, e isso explicaria um maior sucesso das novelas. Mas o que espanta é como uma narrativa pobre e cheia de clichês não constrange qualquer pessoa com um mínimo de proximidade com narrativas um pouquinho mais complexas -- o que deveria ser o caso não só das elites, mas de qualquer classe média que estudou literatura na escola. Não é só o conhecimento médio no Brasil é que é muito baixo, também o conhecimento das elites intelectuais. É claro que jornalistas não podem dar às costas a fenômenos sociais como as novelas. Mas que delirem enquanto espectadores, é preocupante.

O sucesso das novelas no Brasil se insere em um contexto maior: a televisão ocupa um papel de importância desproporcional na vida do brasileiro e de boa parte dos latino-americanos. Não há dúvida: coube à televisão compensar um passivo histórico de instrução e entretenimento em um continente pobre, que pouco viu livros ou teve opções. E coube às novelas -- seja no México ou no Brasil -- ocupar o espaço deixado pela falta de literatura, teatro, ópera ou cinema.

Mas está na hora de dar um passo à frente. A audiência das novelas e a importância que elas têm no cotidiano do brasileiro deveriam estar caindo como a mortalidade infantil e a pobreza. Mas a popularidade delas está aumentando -- enquanto a boa Literatura foi praticamente banida das provas do Enem, por exemplo. Podem parecer coisas distantes, mas não são. Os baixíssimos índices de leitura no Brasil, na comparação a países não tão distantes como a Argentina, são conhecidos, nem é preciso repetir. O problema é: este cenário não dá sinais de estar em mutação para melhor. Ao contrário, o número de leitores no Brasil está em queda livre. E achar que acontece o mesmo ao redor do mundo por causa da internet é ilusão: o número de leitores na França é praticamente o mesmo desde 1980 -- na verdade aumentou ligeiramente. O mercado do livro digital está explodindo. Mudou apenas a plataforma.

Não se quer uma população que renuncie às novelas para posar de intelectual, mas uma população que se sinta naturalmente constrangida ou entediada diante de uma criação ficcional tão primária. O fascínio pela ficção e por histórias bem contadas que invariavelmente nos fazem refletir sobre as nossas próprias vidas é universal. A pergunta que fica é: saciar esse desejo com Adriana Esteves ou com Maria do Bairro nos abre que portas imaginativas, criativas, intelectuais? O tipo de país que será construído por uma elite cultural cuja capacidade de formulação é tão complexa quanto Avenida Brasil é o mesmo que ela vem construindo nos últimos 500 anos.


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Bom trecho:

O sucesso das novelas no Brasil se insere em um contexto maior: a televisão ocupa um papel de importância desproporcional na vida do brasileiro e de boa parte dos latino-americanos.


Novamente, via http://www.brasilpost.com.br/gabriel-brust/novela-sintoma-de-uma-sociedade-que-nao-le_b_4760245.html





EDIT:


Nota do editorA antropóloga Lígia Krás foi inspirada por este texto para escrever a reflexão abaixo. Vale a leitura - quer você concorde ou não com Gabriel:
- "Novela é o retrato de um país que é popular mas que não quer ser"
 
Última edição:
Bom texto Camilo, vou postar um aqui que me tirou algumas reflexões sobre a cultura da TV brasileira e os brasileiros.

O que diz o selfie dos globais, além de imitar a foto dos astros de Hollywood?

"Creiços", escreveu um famoso blogueiro ao ver o 'selfie' que William Bonner fez, no domingo (16), ao lado de atores e atrizes globais durante o prêmio Melhores do Ano 2013, do Domingão do Faustão. O termo usado significa algo como bregas, toscos, cafonas.

Mas por que a revolta? A foto é uma reprodução do famoso autorretrato feito por Ellen De Generes com os astros de Hollywood durante a apresentação do último Oscar, no começo do mês. E a "homenagem" brasileira teria imprimido provincianismo.


selfie-oscar.jpg


O que a foto dos brasileiros revela, entretanto, vai mais além. Se diversas áreas da cultura e das artes no país conseguiram uma quase autonomia ainda que capenga em relação aos países produtores de saber e cultura (leia-se Estados Unidos e Europa), tanto a TV brasileira assim como o jornalismo continuam no mais total estado de colonialismo cultural.

Não existe nada na TV brasileira que não seja um produto que já foi testado "lá fora", ou inspirado em algo produzido nos Estados Unidos e nos países ricos da Europa. A exceção chamada Chacrinha confirma a regra. Copiar, que todos preferem usar com outro nome, é regra vital na chamada "criação brasileira televisiva".

A presença de William Bonner na foto coloca em xeque outra área do conhecimento que sofre do mesmo mal: o jornalismo.
A começar com todas as estruturas de lide e técnicas de "objetividade" que são meras reproduções dos ensinamentos do jornalismo estadunidense. Vocês sabem que existem outras formas de escrever uma matéria?

É comum, no meio de jornais, revistas e sites, ter a referência da matéria estrangeira como guia, leme, como se fôssemos incapazes de criarmos algo do zero e tudo só teria realmente legitimidade se tiver como algo antecessor a tal "referência" de algo feito "lá".

Aliás, o nome referência é uma forma sofisticada para dizer: "cópia". É neste exercício exaustivo da impossibilidade de criação e, de certa forma, sentir-se inferior, que nossa TV e nosso jornalismo continuam a construir seu triste caminho pouco criativo que até este que vos escreve está fadado a trilhar.
'Creiços' somos todos nós, jornalistas e profissionais de TV, os atores globais são mero detalhe!

 
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Bom texto Camilo, vou postar um aqui que me tirou algumas reflexões sobre a cultura da TV brasileira e os brasileiros.
O que diz o selfie dos globais, além de imitar a foto dos astros de Hollywood?

"Creiços", escreveu um famoso blogueiro ao ver o 'selfie' que William Bonner fez, no domingo (16), ao lado de atores e atrizes globais durante o prêmio Melhores do Ano 2013, do Domingão do Faustão. O termo usado significa algo como bregas, toscos, cafonas.

Mas por que a revolta? A foto é uma reprodução do famoso autorretrato feito por Ellen De Generes com os astros de Hollywood durante a apresentação do último Oscar, no começo do mês. E a "homenagem" brasileira teria imprimido provincianismo.


http://p2.trrsf.com/image/fget/cf/510/680/54/0/301/401/images.terra.com/2014/03/16/selfie-oscar.jpg

O que a foto dos brasileiros revela, entretanto, vai mais além. Se diversas áreas da cultura e das artes no país conseguiram uma quase autonomia ainda que capenga em relação aos países produtores de saber e cultura (leia-se Estados Unidos e Europa), tanto a TV brasileira assim como o jornalismo continuam no mais total estado de colonialismo cultural.

Não existe nada na TV brasileira que não seja um produto que já foi testado "lá fora", ou inspirado em algo produzido nos Estados Unidos e nos países ricos da Europa. A exceção chamada Chacrinha confirma a regra. Copiar, que todos preferem usar com outro nome, é regra vital na chamada "criação brasileira televisiva".

A presença de William Bonner na foto coloca em xeque outra área do conhecimento que sofre do mesmo mal: o jornalismo.
A começar com todas as estruturas de lide e técnicas de "objetividade" que são meras reproduções dos ensinamentos do jornalismo estadunidense. Vocês sabem que existem outras formas de escrever uma matéria?

É comum, no meio de jornais, revistas e sites, ter a referência da matéria estrangeira como guia, leme, como se fôssemos incapazes de criarmos algo do zero e tudo só teria realmente legitimidade se tiver como algo antecessor a tal "referência" de algo feito "lá".

Aliás, o nome referência é uma forma sofisticada para dizer: "cópia". É neste exercício exaustivo da impossibilidade de criação e, de certa forma, sentir-se inferior, que nossa TV e nosso jornalismo continuam a construir seu triste caminho pouco criativo que até este que vos escreve está fadado a trilhar.
'Creiços' somos todos nós, jornalistas e profissionais de TV, os atores globais são mero detalhe!

Bom texto. davidzor sempre com boas contribuições.

Todavia, gostaria que aqui no Brasil o jornalismo copiasse uma característica MUITO FORTE do estadunidense: deixar às claras seu posicionamento.

Tirando a Veja e alguns veículos menores, o mainstream jornalístico se autodeclara IMPARCIAL. Isso prejudica a população - que, aqui, não tem base para discernir sobre SUA PRÓPRIA orientação política; ser apolítico se torna a saída natural - em algo que ela poderia evoluir.

Aliás, não só o jornalismo mainstream americano deixa claro sua linha editorial. Pelo (pouco) que conheço, o mesmo ocorre no Canadá, na França, na Espanha, na Alemanha e na Noruega. Chuto que ocorra em outros países também.
 
via http://www1.folha.uol.com.br/colunas/vladimirsafatle/2014/04/1433855-a-ditadura-venceu.shtml




A ditadura venceu
por Vladimir Safatle


Hoje é o dia que marca, afinal, os 50 anos do golpe militar ocorrido em 1º de abril de 1964. Durante as últimas semanas, a sociedade brasileira foi obrigada a ler afirmações de personagens como o senhor Leônidas Pires Gonçalves, primeiro ministro do Exército pós-ditadura, insultando o país ao dizer que: "a revolução (sic) não matou ninguém"; e que ela teria sido uma necessidade histórica.

Antes, correntistas do banco Itaú, uma instituição tão organicamente ligada à ditadura que teve um de seus donos, o senhor Olavo Setúbal, nomeado prefeito biônico da cidade de São Paulo, receberam uma singela agenda onde se lia que o dia de hoje seria o aniversário da dita "revolução". Ninguém, nem nas Forças Armadas nem no setor empresarial que tramou e alimentou o golpe teve a dignidade de pedir à sociedade perdão por um regime que destruiu o país.

É claro que ainda hoje há os que procuram minimizar a ditadura afirmando que ela foi responsável por conquistas econômicas relevantes. Raciocínio semelhante foi, por um tempo, utilizado no Chile.

Tanto em um caso quanto no outro esse raciocínio é falso. A inflação brasileira em 1963 era de 78%. Vinte anos depois, em 1983, era de 239%. O endividamento chegou, ao final da ditadura, a US$ 100 bilhões, legando um país de economia completamente cartelizada, que se transformara na terceira nação mais desigual do mundo e cujas decisões eram tomadas não pelo ministro da economia, mas pelos tecnocratas do Fundo Monetário Internacional chefiados pela senhora Ana Maria Jul. A concentração e a desigualdade se acentuaram, o êxodo rural destruiu nossas cidades, a educação pública foi destroçada, a começar por nossas universidades.

Mas o maior exemplo desse revisionismo histórico encontra-se na crença, de 68% da população brasileira, de que aquele era um período de menos corrupção. Alguém deveria enviar para cada uma dessas pessoas os dossiês de casos como: Coroa-Brastel, Capemi, Projeto Jari, Luftalla, Banco Econômico, Transamazônica e Paulipetro.

Tudo isso apenas demonstra o fracasso que foi, até agora, o dever de memória sobre a ditadura.

Mas o que poderíamos esperar de governos, como o de Fernando Henrique Cardoso, cujos fiadores eram Antônio Carlos Magalhães e Jorge Bornhausen, e de Luiz Inácio Lula da Silva/Dilma Rousseff, que tem em José Sarney um de seus pilares e em Antonio Delfim Netto um de seus principais conselheiros?

Como esperar uma verdadeira política contra a ditadura de governos que dependem de figuras vindas diretamente da ditadura?

Foi assim, de maneira silenciosa, que a ditadura venceu.




via http://www1.folha.uol.com.br/colunas/vladimirsafatle/2014/04/1433855-a-ditadura-venceu.shtml
 

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