Desde os anos 1990, o grupo paulistano publica ficção científica, procurando trazer os clássicos do gênero para o leitor brasileiro. “Para livreiros, editores e imprensa, ficção científica não vendia bem porque não estava sendo bem feita. Nós queríamos devolver para o Brasil um gênero literário, e estamos conseguindo”, diz Adriano Fromer, diretor editorial (e filho do fundador) da Aleph.
Após quase uma década republicando autores do cânone do gênero, como Isaac Asimov (Fundação; Eu, Robô), Arthur C. Clarke (2001 - Uma Odisséia no Espaço), Philip K. Dick (Androides Sonham Com Ovelhas Elétricas, que deu origem a Blade Runner) e William Gibson (Neuromancer, que influenciou Matrix), a Aleph vive em 2015 o começo de uma nova fase, com foco em novos autores de "sci-fi" e em Star Wars.
“Primeiro, você precisa recolocar os clássicos no mercado. Um clássico é fundamental para formar um leitor. Agora, com a lição de casa sendo feita direitinho, acreditamos que também há espaço para novos autores nesse mercado”, acredita Fromer, que sonha em vender 1 milhão de cópias com os lançamentos da coleção de livros do universo de Star Wars -- como Herdeiro do Império, de Timothy Zahn, que já vendeu mais de 50 mil cópias, e o recém-lançado Provação.
Na entrevista a seguir, Fromer conta mais sobre o projeto editorial da Aleph, fala sobre como foi conquistar a coleção de Star Wars e dá dicas de leitura a quem está viciado em games de ficção científica como Destiny e Halo mas ainda não entrou nesse universo pelo mundo das letras. Bora ler?
As bonitas capas e o visual caprichado dos livros da Aleph são um diferencial da editora.
IGN Brasil: Por que a Aleph começou a publicar ficção científica?
Adriano Fromer: Nos anos 90, a Aleph começou a publicar ficção científica por um gosto pessoal do meu pai e por acreditar que ninguém estava fazendo. Não teve um resultado comercial interessante, e a editora tomou outros rumos. Em 2003, retomamos esse caminho por acreditar que a ficção científica é um tipo de literatura muito boa, muito interessante e rica, com potencial comercial, mas que estava sendo ignorada pelo mercado. Para livreiros, editores e imprensa, ficção científica não vendia. É questão de ser ou não ser um bom livro. E livros como Fundação, do Isaac Asimov, Laranja Mecânica, O Fim da Infância e outros trocentos são ótimas publicações, mas que estavam abandonadas por causa deste padrão de comportamento. Nossa motivação foi mudar essa lógica dos acontecimentos. Não vendia porque não estava sendo bem feito. A gente queria devolver para o Brasil um gênero literário.
IGN Brasil: Dá para perceber que a Aleph está fazendo uma transição: depois de lançar um bom catálogo de clássicos de ficção científico, a editora começa a apostar em lançamentos e novidades. Queria entender por que é tão importante ter esse catálogo de clássicos?
Adriano Fromer: Como é que você vai devolver para o mercado um gênero literário sem as obras mais importantes desse gênero? Um clássico é fundamental para a formação do leitor, além de serem obras extremamente boas. Afinal, um clássico não é só um clássico: ele vira um clássico, é uma obra atemporal e universal. São excelentes livros.
IGN Brasil: Em 2015, a Aleph parece ter atingido um segundo momento: a editora já conseguiu formar um bom catálogo, com os principais clássicos, e agora começa a investir em lançamentos e pensar em trazer autores nacionais. Como é isso para vocês?
Adriano Fromer: Estamos super otimistas. A sensação é de que a lição de casa foi feita direitinho. Antigamente, os fãs reclamavam que tinha muita coisa nova sendo feita, mas que a gente só lançava os clássicos. Para mim, é um processo natural: primeiro, você tem que recolocar os clássicos de volta no mercado. Ainda tem muita coisa pra colocar, mas acredito que a gente já tenha 80% dos principais ícones publicados pela Aleph. E não é só “clássico”: são livros que tem potencial comercial.
Laranja Mecânica, por exemplo, vendeu muito bem. De forma bem otimista, estamos acreditando que há espaço para novos autores também nesse mercado. É difícil dizer o que faremos ainda -- o Sombras do Paraíso e o CyberStorm são as primeiras apostas que estamos fazendo esse ano. Criamos um núcleo duro, para aproximar o pessoal do centro gravitacional, e agora estamos trazendo novos elementos para esse universo.
Kenobi, da coleção Star Wars, imagina o que acontece com o mestre Jedi entre as duas trilogias de George Lucas...
IGN Brasil: Ficção científica é para todos os tipos de leitor, mas quem é o principal público-alvo da editora?
Adriano Fromer: Percebemos que há um público muito jovem consumindo os clássicos, o que é animador, e um público adulto mais focado, que é fã de ficção científica há muito tempo. É difícil precisar quem é o nosso leitor, mas são jovens com perfil mais variado e um adulto que gostava de ficção científica desde sempre. A linguagem visual da Aleph ajuda neste sentido: a gente quer dar uma cara cool e cult para os livros clássicos. É uma coisa difícil de alcançar: uma capa que não agride o fã de ficção científica, mas capta um cara que não transita nesse universo. Acho que a capa do Eu, Robô, de Isaac Asimov, é um bom exemplo disso.
IGN Brasil: Antigamente, ser fã de ficção científica era considerado ridículo. Hoje, tudo parece conspirar nesse universo -- de games como Destiny e No Man’s Sky a filmes como Star Wars e Jurassic World. O mundo está mais sci-fi?
Adriano Fromer: Acho que o mundo está mais geek do que antigamente. O que a gente está vendo hoje em dia é a realização daquele filme dos anos 1980, “A Vingança dos Nerds”. O antigo "loser" deu uma reviravolta e se tornou popular. Os nerds enriqueceram e ficaram famosos, conquistaram espaço e mostraram que ser inteligente e culto é legal. A própria cultura está dando conta de valorizar mais o nerd do que antigamente. A ficção científica, como está diretamente relacionada ao nerd, tem um ganho muito grande. Em alguns círculos, falar que você não leu Asimov pega até mal (risos). Mas a Aleph é uma gota d’água dentro dessa onda gigantesca que está vindo aí.
IGN Brasil: Uma das grandes apostas da Aleph em 2015 são os livros da coleção de Star Wars. Queria saber como foi o trabalho para convencer a Disney do potencial da editora e como é surfar nessa onda que está para chegar.
Adriano Fromer: Começamos a negociar antes da novíssima trilogia ser anunciada. A ideia era fazer com Star Wars o que a gente já fazia na Aleph: um universo cheio de fãs, com um monte de livro legal que estava marginalizado. No meio das negociações, que estavam muito tranquilas, a Disney foi lá e comprou a Lucasfilm, e aí os grandes grupos editoriais brasileiros ficaram interessados. Foi uma concorrência difícil.
Vamos surfar na onda, mas a gente teve a ideia antes de todo mundo, tomou caldo, remou, remou.... é fácil ir atrás do livro do Star Wars quando todo mundo está falando disso. Difícil é ter um plano editorial cuidadoso, com direito a trazer autor para o Brasil e dar carinho para o fã. A gente não tinha como concorrer com as outras editoras financeiramente, então trabalhamos no que a gente conhece muito: cultura de fã, ficção científica e livros relacionados a filmes. E foi isso que a Disney encontrou na gente, eu acho.
Clássicos como Duna, Fundação e a trilogia Sprawl, de William Gibson, ganharam reedições caprichadas pela editora paulista.
IGN Brasil: A meta de vender 1 milhão de livros da série Star Wars coloca a Aleph em um novo patamar do mercado editorial. Como vocês veem o futuro da editora? Querem ser uma editora de nicho ou a gente pode ver a Aleph se tornando gigante em todos os segmentos?
Adriano Fromer: Não queremos ser uma Companhia das Letras. O que queremos é expandir a experiência além do livro. Mais do que ser um conglomerado editorial, nós queremos começar a fazer cursos relacionados à ficção, ou fazer eventos. A ideia é dar outras atividades para o mesmo público.
IGN Brasil: A última pergunta é: por onde começar? Quero uma indicação para o leitor do IGN que é fã de Destiny e de games sci-fi e quer ler os clássicos da ficção científica.
Adriano Fromer: Vou fazer duas indicações, porque uma só não dá (risos). Um bom lugar para começar é o Androides Sonham Com Ovelhas Elétricas?, do Philip K. Dick. É o livro que inspirou o Blade Runner, e é um ótimo começo porque é uma ficção científica “soft”, não entrando muito na questão técnica de um Isaac Asimov, por exemplo. É divertido, inteligente, tem a referência pop do filme, apesar de serem histórias diferentes. Tem filosofia e tem suspense, mas sem ser chato. É o livro para começar. Mas o meu favorito é O Fim da Infância, do Arthur C. Clarke. É um livro mais parado, o que pode afastar alguém que gosta de muita ação. Foi o livro que me trouxe para a ficção científica. Qualquer coisa que eu falar da história do livro vai estragar... é o tipo de livro que você tem três desfechos no meio do livro. Você tá lendo, parece um final de livro, e aí você vai ver e tem mais 100 páginas para acabar. É genial. São os dois livros que eu indicaria: o primeiro para iniciantes, e o segundo mais para iniciados.