Eu nasci em uma família inteiramente Adventista do sétimo dia por parte de pai e mãe. Pra facilitar a vida de quem não conhece, vai aqui um resumo grosseiro do que é um adventista: Judeus que acreditam em Jesus e no novo testamento. Desde que eu entendo a língua portuguesa, eu ouço de Jesus, da bíblia, de Deus, de religião, de orar, de musicas cristãs e etc, e desde que eu nasci, fui todo sábado à igreja, e como Adventistas guardam e o sábado, nesse dia eu nunca pude fazer nada que não fosse relacionado à igreja. Isso mesmo, minha infância inteira, nos sábados (TODOS ELES) eu não podia fazer coisas como ouvir musicas que não fossem de evangélicas, ler nada que não fosse a bíblia, assistir coisas que não fosse de da igreja e o que mais me irritava na infância, não podia jogar videogame nesse dia. Além dessas limitações do dia do sábado que sempre consumiam metade do meu final de semana, tornando o sábado um dia extremamente desagradável, diversas mídias que eram muito populares entre meus amigos eram excluídas da minha vida e eu simplesmente tive isso cortado da minha infância. Alguns desses exemplos são: Dragon Ball, Pokémon e tudo que vem da animação japonesa, Rei Leão e tudo que vem da Disney, Power Rangers entre outras coisas, porque a igreja divulgava que esse tipo de coisa provinha do demônio e que se eu assistisse eu iria “pular da janela ou matar meus pais”. Todos os dias quando eu ia me alimentar ou dormir, meus pais oravam comigo, e todas as manhas eram feitas meditações matinais lendo livros religiosos. Essa foi minha vida até aproximadamente 11 anos de idade.
Até esse ponto, não existia outra realidade para mim, afinal, eu ouvi isso desde que nasci, não existia outro mundo se não o que meus pais e minha igreja me contaram. E o que são crianças se não caixas vazias, prontas para serem preenchidas com a primeira coisa que for colocada dentro? Porém eu não fazia nenhuma dessas coisas por conta própria, eu só seguia scripts e não pensava sobre o assunto. Até um dia em que eu despertei e pensei: “Nossa, Deus existe, eu sou cristão e quero ir para o céu”. Basicamente foi o momento em que eu comecei à racionalizar sobre o assunto. E então eu peguei a Bíblia e todo o conhecimento religioso que eu já tinha adquirido e comecei à estudar e a pensar sobre isso. Foi nesse ponto em que eu comecei a ficar com medo. Isso mesmo, medo. Porque desde que eu nasci, eu ouvi que existe um Deus no céu que me ama. Esse Deus que colocou uma série enorme de regras que são difíceis de se seguir, porque muitas delas são chatas e castradoras da nossa felicidade que cortam nossas asas como seres humanos. Como por exemplo as do sábado. E mesmo criança quando eu nem sabia o que era a minha religião direito, eu quebrava as leis do sábado, simplesmente porque elas eram insuportáveis. E aí eu comecei a pensar: “esse Deus que me ama e tem um milhão de regras insuportáveis, de acordo com a bíblia, se eu não seguir essas regras, eu vou ser condenado ao sofrimento eterno.” Parece simples, não? Só seguir as regras. Mas não era. É dito diversas vezes na Bíblia que só quem ama a Deus sinceramente que vai pro céu. E aí eu comecei a ficar com medo, porque no fundo, apesar de tudo, eu sabia que eu ia pro inferno, porque na minha cabeça era INCONCEBÍVEL eu amar um ser invisível e mudo. E seguir as regras não porque eu quero me salvar e sim porque eu amo ele parecia um absurdo. E eu vivi alguns anos da minha infância com medo sempre que pensava nessas coisas, e isso me incomodava muito. Até que eu cheguei à uma conclusão: “Se eu não consigo amar de verdade um Deus mudo e invisível, basta eu conseguir ver e ouvir ele.” E aí eu comecei à me dedicar muito à igreja e à orar bastante, procurando ver, ouvir ou sentir algo da presença de Deus. Esse foi o primeiro estágio da minha libertação da igreja. Eu estava BUSCANDO ver Deus. E aí que começaram uma série de decepções. (...)
Eu pensava comigo mesmo: “tem tanta coisa na bíblia que faz sentido, não tem como ser tudo mentira! Eu cresci com isso, mas se ele não responde, então ele certamente me abandonou, e abandonou a humanidade.” E isso continuou na minha cabeça até eu entrar no 9º ano do ensino fundamental, com 14 anos de idade. Nesse ano meus pais se separaram, e como um bom adolescente, eu entrei na minha fase revoltada. E aí eu me tornei aquele tipo de “Ateusinho revoltado” que o diz que não acredita em Deus porque odeia ele, e não porque sabe de sua inexistência. Esse clássico tipo de revolta religiosa que leva muitas pessoas à dizerem que são ateus e mais tarde quando superam aquela angustia interior, dizem que foram “convertidos de novo”. É o que eu chamo de Pseudo-ateu revoltado. E nessa fase que eu ficava debochando da igreja e de Deus, ouvindo bandas de Metal que se consideravam satanistas e esse tipo de coisa. Mas no fundo, eu sempre ficava com a consciência pesada, sentindo que eu tava fazendo algo errado e que algum tipo de Deus estava vendo tudo isso e me julgando, e que eu ainda podia me arrepender e voltar atrás. Aí aconteceu que eu realmente de tempos em tempos voltava atrás, conversava com um pastor ou teólogo e explicava tudo o que eu pensava e sentia e pedia conselhos. E sempre era a mesma história. “Faz isso isso e aquilo que você certamente vai sentir a presença de Deus”. E isso se repetiu umas 4 vezes em que eu fazia os procedimentos de orações e meditações durante alguns meses e nada acontecia, e nada eu sentia. Até que eu fiz 15 anos e fui para o internato. E aí após tantas decepções incontestáveis, eu passei a ser Agnóstico. O terceiro estágio do meu ateísmo.
Vou tentar explicar aqui porque eu me tornei anteriormente “Pseudo-ateu revoltado” e agora agnóstico e não Ateu de uma vez por todas: porque a minha cultura e meio religioso privou a minha vida inteira de conhecimentos básicos científicos que eu precisava para entender a inexistência de deuses e coisas básicas como a Evolução. Desde pequeno foi colocado na minha cabeça dia e noite vídeos, livros e textos criacionistas com argumentos furados falando mal do evolucionismo, mas eu era só uma criança, como poderia entender aquilo? Na minha cabeça, mesmo não acreditando em Deus, eu não acreditava na ciência. E então como Agnóstico, eu comecei a afirmar: “Não se pode provar a existência de Deus, nem a sua inexistência. Talvez exista, talvez não exista. Me importa? Não. Eu vivo sem me preocupar com isso.”
(...) Só que tinha um pequeno problema. Eu tinha constantemente crises existenciais que me deixavam deprimido e muito mal. E hoje eu consigo ver o motivo disso. É porque eu nasci e cresci com a vida tendo um significado, e eu tinha acabado de abandonar esse significado e sentido e aceitado que ele não era verdadeiro. Eu me sentia no vazio. E eu fui levando isso comigo nos 15, 16 até que eu fiz 17 anos ano passado. Nesse ponto da minha vida, eu já era um agnóstico forte, porque não existia nem resquício de consciência pesada ou vontade de voltar atrás. E foi aí que minha vida mudou.
Um dia do ano passado, eu liguei a minha TV e coloquei na Netflix. Eu vi uma série documentário em exibição: COSMOS, de Neil deGrasse Tyson. Interessado no assunto, eu cliquei e comecei à assistir. Eu sempre falava “A Evolução é tão improvável quando a criação, o ser humano nunca vai saber de onde veio e isso não interessa”. E eu dizia esse tipo de coisa, porque minha mente estava cheia desde a infância com as ideias idiotas e falaciosas pseudocientíficas criacionistas criadas pela religião para entupir nossos cérebros e nos privar da realidade. E quando eu vi esse documentário meus olhos se abriram e eu comecei à estudar, pesquisar e procurar mais, ver outros documentários, ler textos e artigos científicos, ouvir vlogs e ler blogs sobre o assunto, ler livros e me aprofundar. E eu entendi como funcionava o nosso universo, como nós evoluímos de um ser unicelular, quais as evidências palpáveis que nós temos hoje para ter certeza disso, como nosso universo surgiu e como nós sabemos disso. Meus olhos se abriram para outra realidade que eu nunca havia experimentado antes e meu universo ficou colorido. Eu entendi que eu era fruto de uma supernova, que causa uma gigante destruição, mas que eu era extremamente privilegiado de ter me desenvolvido e existido mesmo assim. Eu percebi que posso tocar essas estrelas no céu à milhões de anos luz de distância, porque os fótons que saem dela atravessam todo o vácuo e tocam meus olhos. Eu descobri que eu era parte das estrelas, e a mesma matéria que criou todas elas com 13,7 bilhões de anos era a matéria dos átomos que compunham meu corpo me faziam um ser vivo pensante. Eu vi como o método científico que foi cautelosamente desenvolvido com o passar dos séculos com erros e aprimoramentos nos levou até onde estamos, e que tudo que temos e conseguimos provêm dessa ciência. E como os maiores cientistas fizeram suas maiores descobertas. A partir desse momento, todas as minhas crises existenciais foram embora. Eu me senti vivo. Eu me senti parte do universo. Eu fiquei mais feliz e em paz comigo mesmo do que nunca com a igreja. Eu notei que viver com Deus e a criação como seu sentido de vida, era algo pequeno, banal e pífio comparado à realidade de nossas origens. Aos poucos eu fui me livrando do MAL que a religião faz conosco. E então eu virei Ateu.