Alguém aí falou em aumento nos preços dos jogos?
Isso já estava nos planos das publishers há um bom tempo. Não à toa, vêm promovendo uma longa campanha de desinformação e gaslighting através da "imprensa" americana, que age como porta-voz dessas empresas, numa verdadeira extensão dos departamentos de marketing.
Digo "imprensa", assim, entre aspas, porque elevar lixos como Kotaku, Polygon e Vox à categoria de imprensa profissional chega a ser ofensivo. Jornalismo de games é, no máximo, um tipo de imprensa entusiasta. E quando o público-alvo tentou demonstrar essa discrepância, as partes afetadas espernearam e fizeram de tudo para mudar a narrativa, até alcançarem o seu objetivo.
Doritos Pope: imprensa entusiasta definida em uma imagem emblemática
Como consequência, nos últimos anos, os consumidores foram levados a acreditar que jogos realmente estavam muito baratos, e os seguidos aumentos eram justificados não só por causa da inflação, mas também porque isso certamente iria refletir em salários melhores e horas mais curtas para os pobres e indefesos devs. A realidade, claro, é bem mais complexa.
Sempre que esse assunto entra em pauta, os tais "jornalistas" são rápidos em dizer que fazer um jogo na geração HD ficou muito mais caro, como se todo título fosse um triplo-A do tamanho (e qualidade) de um GTA ou RDR. Mas, convenientemente, esquecem de mencionar que os custos de hardware, software e distribuição diminuíram muito. E que, além disso, o número de jogadores e fontes de receita aumentou consideravelmente.
O mercado está infestado de shovelware como Poop Slinger - não exatamente um triplo-A
Por exemplo, cada uma das estações de trabalho Silicon Graphics (SGI), que a Rare usou para produzir os gráficos pré-renderizados de
Donkey Kong Country,
custou £80,000 - em 1993. Ainda tiveram que investir em um sistema robusto de ar-condicionado, capaz de resfriar as máquinas. E, como se não bastasse, precisavam esperar a noite torcendo para que, na manhã seguinte, tivessem algo renderizado corretamente e que pudesse ser utilizado.
Era comum que os funcionários do estúdio britânico viajassem pessoalmente para o Japão, levando cópias de testes do jogo consigo para análise e aprovação da Nintendo, já que esta era uma opção mais rápida e confiável a enviar por courier. Na hora de colocar à venda, dependiam da Big N, que, como toda
publisher, cuidava da logística e negociava espaço nas prateleiras das lojas.
Uma das estações de trabalho usadas pela Rare para produzir os gráficos pré-renderizados de DKC, a SGI Challenge XL
Hoje em dia, uma única pessoa é capaz de produzir e publicar seu próprio game, usando um simples laptop, ferramentas gratuitas (de modelagem, engines, etc.), e pagando pouco ou nada para ter seu jogo disponível ao redor do mundo, imediatamente, em diversos marketplaces.
Agora, o fator mais importante (e que, novamente, aqueles do lado errado da discussão desconsideram, cometendo a falácia lógica de evidência suprimida), é o crescimento descomunal da indústria.
Para se ter ideia, em 2005 - ano do último reajuste efetivo no preço de tabela dos jogos, de 50 USD para 60 USD (um aumento de 20%) -,
a receita total foi de 10.5 bilhões de dólares. Em 2022,
esse valor deve chegar a 184.4 bilhões de dólares -
1656.2% a mais, e muito acima da inflação no período correspondente.
O mercado de games teve um crescimento exponencial nas últimas duas décadas
Não dá para comparar o mercado de hoje com o de 20, 15, ou até 10 anos atrás. A quantidade de jogadores (consumidores) não para de crescer. Plataformas móveis são cada vez mais rentáveis. E as
publishers dão um jeito de inserir meios alternativos de gerar receita (DLC,
season passes, microtransações) até em jogos
single player.
Empresas de games tiveram lucro recorde nos dois primeiros anos de pandemia (confirmando a análise citada, que as pessoas continuam gastando com jogos mesmo durante recessões). E o que essas empresas fizeram,
ao primeiro sinal de encolhimento, com todo o mundo voltando a sair de casa e, consequentemente, tendo menos tempo para jogar?
Demissões em massa e reajustes nos preços sugeridos.
Quando Tim Sweeney anunciou que a Epic Games Store iria cobrar apenas 12% de comissão sobre as vendas na loja (frente aos 30% que são padrão na indústria), ele chegou a dizer que, depois de alguns ciclos,
nós veríamos preços menores, pois os devs iriam repassar o que economizaram aos consumidores, percebendo que poderiam vender mais cópias por um preço melhor. Isso nunca aconteceu.
Os apologistas do corporativismo frenético acreditam cegamente nessas desculpas esfarrapadas, e tem quem defenda até a sindicalização dos estúdios, sob a crença equivocada que esse tipo de mudança irá reverter em benefícios aos funcionários. Como a história insiste em provar, não é assim que funciona.
Tl;dr: não se iluda, se uma empresa tivesse a chance, ela comeria você e todos que você ama.